January 30, 2019

Dificuldades do estudo filosófico

É horrível estar escrevendo algo aí pelo próprio desenvolvimento da coisa você vê que na verdade o ponto que você quer chegar era na verdade outro. Você percebe que não tem como fazer a coisa inicial aí precisa ir lá e catar cada fio dessa ideia abortada. saco hein.

Pior também quando você descobre que simplesmente não existe bibliografia para o que você quer estudar. [e eu acho que não tenho o menor espírito para virar historiador de arquivo, nem saberia como]

Pensar e escrever cansa demais. Eu fico fisicamente exausto. Ler é algo que pode ser pesado (dependendo do nível de importância, densidade e do que se está produzindo de notas), mas nunca chega aos pés da escrita.

January 28, 2019

Picuinhas filosóficas são perda de tempo

Resumindo pois me parece uma boa forma de ver se aprendo (a partir do papo com @toujourmicelio): entrar em picuinhas de autores europeus não faz sentido. Escolher um lado entre hegel e deleuze como se eles batalhassem em campos etéreos e abstratos não faz sentido daqui.

Esse luxo de acreditar que ideias nascem puramente da cabeça dos seus portadores é algo dificílimo de sustentar da periferia do capitalismo. Não é então que eles estão num éden e nós devemos alcança-los. Eles é que estão mais fundos na ilusão de que são autores das suas ideias.

Eu acho que ser francês, ser inglês, ser alemão te dá uma legitimidade e uma confiança inalcançável do lado de cá. É muito estranho. A coisa pra mim uma vez ficou clara num evento que assisti com Markus Gabriel em que ele rejeitou Aristóteles com alguns argumentos.

Não é que ele tenha sido arrogante (e ele pessoalmente é, apesar de muito gentil), mas (como falei com outras pessoas), esse gesto, rápido e sem hesitação apontava para um tipo de legitimidade para pensar que não sei se encontramos aqui (mas de novo, não acho isso fraqueza).

E por isso de certa forma cada vez mais me canso dessas briguinhas de lado a lado b. Na maior parte no fundo tem envolvido ali uma crença de que a disputa de argumentos é completamente pura. Ou talvez eu esteja apenas lendo demais o Paulo Arantes. Pode ser isso também.

Eu tentei rascunhar isso aqui faz um tempinho, mas a coisa estava ainda muito vaga e com pouca concretude (agora ainda tá, mas tá menos): https://thespeculativemonad.wordpress.com/2018/08/23/strange-ebbings-through-the-atlantic/

Volto pra esse tema desde que eu li o Ideias fora do lugar’ pois ali fica bem claro como é estranho receber esse discurso alheio e mesmo assim se ocupar com ele. Explicitar esse ponto me parece fundamental, ainda que as vezes cansativo.

Inclusive eu tenho pensado muito esse tipo de temática (schwarziana-arantiana) junto com essa leitura do Pierre Hadot que me parece riquíssima (eu sei, postei esse texto faz não muito tempo, mas o que fazer com obsessões?): https://becomingintegral.com/2018/05/17/the-irony-of-practice-hypocrisy/

January 24, 2019

Uma reavaliação do problema da moral

Eu era muito alérgico ao tema da moral quando comecei a ler Nietzsche. Quer dizer, ele foi parte da razão dessa alergia ter sido produzida. Ignorando aqui a maneira como esse termo tende a se espalhar em inúmeras direções, nos últimos anos a minha visão tenho repensado isso.

Se ainda não posso afirmar com certeza como descrever a moral fora de uma partilha escolar, tenho sentido cada vez mais que a demanda de uma moral não é em si problemática. Acho que, agora relendo Nietzsche de outra forma, a questão está muito mais nos efeitos dessa moral.

Entender o que aquilo produz, que tipo de vida é permitida a partir daquele conjunto de juízos. A ilusão (que era um pouco aquela que eu estava inserido na ~juventude) era crer que era possível transcender essa situação e se instalar num ponto de vista plenamente ético.

É óbvio que ignorava o elemento genealógico que me parece ser o que inscreve o Nietzsche numa tradição que procura abrir espaço para transformações a partir de uma análise das condições de produção (uma linha que dá pra traçar incluindo Espinosa, Kant, Hegel e Marx entre outros).

January 21, 2019

A falsa-imediaticidade na filosofia

Eu vi um texto agora falando sobre o problema do hedonismo’ da sociedade e nenhuma menção à configuração político-econômica atual. Não dá pra fazer crítica moral da sociedade se você não aborda as questões sistêmicas do capitalismo. Até o The Good Place conseguiu perceber isso.

É claro que o texto é de um (crypto?)-olavista. O que me incomoda mais nessas coisas é essa pretensão filosófica que vem carregada de uma postura que nunca houve na história da filosofia. Uma postura de olha só estou aqui tratando as questões diretamente sem os seus rodeios.”

O louco é que essa idealização de pôr as questões diretamente e sem papas na língua é justamente o que é problematizado desde Platão. Só ver como nos diálogos se desconstrói repetidamente a possibilidade de abordar diretamente certos temas. A operação filosófica é de complicação.

January 20, 2019

A dimensão material do conceito

Basicamente a minha tese foi uma tentativa fracassada de dar conta (tentar descrever, elaborar) a dimensão material do conceito. A tese foi um fracasso por n motivos (entre eles pois eu fui me afastando, por outras razões, desse meu objetivo inicial).

Agora, o curioso é que esse tema tem voltado com muita força, como algo que gostaria de abordar mais uma vez. O curioso, porém, é que boa parte dos autores que sinto que estão tateando por esse tema (ainda que nem sempre com as mesmas intenções que eu) são teóricos marxistas.

No caso são marxistas que desenvolvem a noção de abstração real” a partir do Marx (penso aqui no Sohn-Rethel - que tou doido pra ler -, Postone e Jameson [deve ter outros, eu que sou novato no tema]). Eles procuram entender categorias abstratas que são eficazes na vida social.

Vê-se que não é exatamente o meu interesse (para ser honesto o meu interesse pelo tema vem mais de autores como Pierre Hadot e Deleuze), mas acho que compreender a materialidade do conceito e das abstrações inevitavelmente acaba chegando por outras vias nesse mesmo problema.

January 18, 2019

A filosofia e o ridículo

Ontem passei boa parte da noite discutindo o caráter ridículo de certas atividades e hoje o Safatle faz essa coluna: https://t.co/tPKw9UQlCU

Que a disposição pra fazer filosofia seja meio ridícula não tem problema. Afinal, o Aristóteles põe a coisa muito bem no sentido de que o caminho para a virtude passa por uma certa repetição farsesca, meio fake it till you make it”.

O problema me parece ser quando se passa por cima desse elemento de hesitação. Em que se acredita (ou se engaja) nessa atividade sem que se ponha em questão os limites e as ineficácias de um discurso que se pretende - historicamente - fundador de instâncias sociais e políticas.

O reprimível é o gesto que abraça essa prática como se a sua posição estivesse dada e a sua função já tenha sido justificada (por quem? Pela historia?). Isso me parece antes uma espécie de paixão pela figura do filósofo (e suas pretensões). A atividade filosófica como narcisismo.

A prática filosófica não precisa de redenção para ser eficaz. O que ela precisa é que se incorpore esse elemento de farsa e de ridículo na sua atividade. É uma forma, talvez pouco sutil, de tentar pensar antídotos ao narcisismo e ao ego que circundam na história dessa prática.

Nesse ponto eu ainda acho que preciso articular melhor as coisas, mas me parece que o caminho passa por aí. E pra isso Pierre Hadot me parece fundamental. Por isso post tem me ajudado muito a pensar essas questões: https://t.co/4kNYtU17Ht

O estranhamento de si e da própria prática me parece fundamental nesse processo. O que está em jogo não é confirmar as imagens que se tem de si. Isso, como falei, passa pela paixão que se tem da imagem de si, seja como filósofo, revolucionário ou poeta.

O que me parece produtivo, interessante, é que esse estranhamento e não naturalização da prática acabem por fazer com que ela se metamorfoseie segundo as circunstâncias e exigências que efetivamente se impõem. Não se procura respeitar limites previamente definidos.

Se a filosofia é uma atividade que procura desenvolver conceitos para navegação, a paixão pela figura do filósofo, ainda que atraente (ao menos para mim), é no fim das contas um jogo que só reafirma estereótipos sem se pôr em crise. E sem se pôr em crise só se repete clichês.

Esse é o problema dos filósofos que o Safatle menciona, que ele aborda. São pessoas apaixonadas pelo que representa se perguntar pelo bem, pelo belo, pelo ser. Daí circularem eternamente nessas questões da forma mais pretensamente imediata, como se os tornasse mais nobres.

O inverso se vê na academia. Enquanto aqueles veneram de perto, estes veneram de modo oblíquo de longe. Transformando os filósofos da tradição em vacas sagradas. Cada peido tem um valor insuperável e a única tarefa digna é pssar o resto da vida entendendo o conceito de cogito”.


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