October 29, 2020

O mito da homogenidade do romance burguês

Uma impressão que eu gostaria um dia de pesquisar de verdade é que aquilo que chamam de romance burguês é mais um mito do que uma forma estável. Mais uma maneira de inteligibilizar rapidamente (e economicamente) uma forma bem experimental e variada que uma realidade de fato.

E a razão que eu acho isso importante é que pelo menos daria um fim a essa interminável ladainha de o fim do romance está próximo”.

É claro que pode existir exemplos que a gente poderia identificar com o que se chama de romance burguês tradicional. Mas o que acho é que o que se encaixa nisso são menos do que imaginamos (e estariam longe de constituir uma totalidade homogenizante).

October 29, 2020

Mímesis e o aprendizado da filosofia

Me pergunto se tem algo de mimético no gesto do aprendizado filosófico. Uma espécie de repetição vazia que não tem como não ser vazia, não tem como não ser vaga no início. O aprendizado (e a incorporaçào?) seria a percepção de que não tem algo além do vazio a ser compreendido.

O mimético estaria no fato de que um pensamento (talvez inclusive na transmissibilidade?) deve parecer um pensamento? Mais do que infinitas tecnicalidades o que importa é algo que pareça filosófico. Acho que as vidas filosóficas da antiguidade tem algo disso.

Está tudo meio vago pois nada é muito claro, mas acho que tem algo a se pensar no fato de que alguns textos filosóficos nos afetam e transformam nossas vidas mesmo que não consigam se fundamentar ou mesmo lastrear seus argumentos.

October 28, 2020

Sobre reduções simplificadoras

Me interessa muito o fenômeno de reduções simplificadoras” que tem um poder de alcance alto. Sobretudo quando essa redução circula em meios que em tese seriam sofisticados. Quando você conhece o assunto é um excelente momento pra medir o grau de conhecimento desses espaços.

Acho interessante isso não pra look down’ (até porque não é como se eu me excluisse desses pontos). Mas é interessante pois ao conhecer o assunto e ver que ele só se propaga com a redução simplificadora você consegue ver que sofisticação intelectual’ não é para tudo.

Tem áreas e áreas, tem inteligências que conseguem inteligibilizar certas coisas mas para outras só conseguem receber de uma forma mais bruta. É especialmente interessante pois acho que deveria — da parte do emissor interessado — pensar e tentar modular essas complexidades.

Gosto de acreditar que em outra vida estou estudando computação.

October 28, 2020

Pesquisa e amizade

Penso muito na importância da philia” (amizade) para a construção de pesquisas. Eu diria que inclusive uma das coisas mais pé-no-saco da profissionalização na filosofia é que como o qeu passa a articular os pesquisadores é o mercado de trabalho, a especialização se torna norma.

As pessoas passam a se associar por serem da mesma área, por trabalharem o mesmo campo. E ainda que isso possa ter utilidade pra várias áreas (e mesmo pra filosofia) quando se torna a forma predominante de pesquisa acho que se perde (de novo da filosofia) os atravessamentos.

Quando o que pauta um grupo de pesquisa são os afetos, a amizade, o interesse (claro, estou idealizando) sinto que há uma maior diponibilidade para se deixar ser afetado pelo tema do outro, o que é uma forma de sair de si. Talvez esteja sendo cafona. Bem, que seja.

October 28, 2020

O descompasso entre tempo de produção de um texto e seu valor

Existe uma ideia que vejo muito (que imagino que tem a ver com a lógica capitalista) que um texto (ou uma obra, um produto qualquer) tem que ser trabalhado” no tempo”. Tem que ser constantemente produto de um cuidado que quanto mais demorado mais seria valoroso.

Então se você faz um texto rápido isso é mal visto, não pode ser admitido. Inclusive acho que até acaba-se criando um jogo de aparências para esconder quanto tempo demoramos para escrever um texto. Demorar tempo demais é sinal” de que fizemos menos que podíamos.

Se demoramos tempo demais, por outro lado, seria um sinal de que somos improdutivos, que se a coisa não está incrível é por uma fraqueza nossa. É engraçado como isso acontece.

O problema é que essa situação na prática da leitura se revela ilusória pois avaliamos sem saber isso.

O que fico pensando é que ainda que a gente sinta que essa coisa do tempo (na hora de produzir) é algo importante (daí as dicas para deixar o texto maturar — ou seja, temporalizando e ampliando seu valor) fico me perguntando se isso não é se concentrar no trabalho vivo do texto?

O que acho curioso é que quanto mais você escreve mais você aumenta o apoio num trabalho morto. É como se você se apoiasse num tempo que não gasta tempo, que permite você fazer certas coisas mais rápidos sem que desvalorize o produto, sem que ele seja menor por isso.

A menos que se revele isso, nesse caso, o receptor, mesmo que tenha gostado do texto pode se sentir fraudado de alguma forma (imagino que tou entrando no território do livro da Ngai sobre GIMMIKCS). É esquisito isso, né. E claro que o apoio no trabalho morto pode gerar problemas.

Se você tá cada vez mais se apoiando em coisas antigas, é bem capaz que você acabe se tornando repetitivo (o que nem sempre é o caso e, principalmente, nem sempre é ruim). Mas o outro lado também rola um problema pelo inverso né? Pois tem textos que não adianta mais trabalhar.

Se o valor vir apenas de quanto tempo você gasta no texto, pode acontecer como quando a gente passa demais uma carne. A gente até sintetiza, suga tudo. Mas aí o que fica é uma merda? E as vezes a gente faz isso por vergonha de chegar rápido demais ao resultado?

Acho que essa questão fica bem mais interessante se a gente pensa no trabalho de alguém tipo o Cesar Aira. Sua obra são apenas procedimentos e ele lança umas 4 novelas por ano faz décadas. Com certeza ele escreve o livro em si muito rápido pois o trabalho está no procedimento.

A genialidade do Aira é em parte perceber que não adianta ficar simplesmente laborando um texto, sobretudo quando já fizeram (ele leva isso radicalmente a serio). Sobra pra ele criar procedimentos que de fato tem ar de truque que poupa tempo.

Pois uma vez criado o procedimento, basta ser fiel ao procedimento (ou seja, o trabalho, o LABOR SOBRE O TEXTO) é relegado ao procedimento. O autor em si apenas fica de boa e segue as instruções, de certa forma (se mantendo fiel a elas independente da qualidade).

Com isso ele consegue jogar fora toda essa balela de que um bom texto é um texto trabalhado. Claro que isso pode ser bom, mas tem tantas outras formas que um texto pode ser bom que inclusive boa parte das novelas do Aira só podem ser umas merdas (é inevitável escrevendo tanto).

E se elas podem ser ruins, chatas, e ainda assim ele ser genial é porque de alguma forma ele conseguiu deslocar o ponto da qualidade de um texto, o seu valor (e bem, tou usando os termos de forma vaga e equívoca) de qualquer cuidado >no tempo< do texto. Ele libera outros valores.

October 26, 2020

Sobre receber elogios e críticas

Eu amo a narrativa um artigo rejeitado por uma revista que eu valorizo menos foi aceito por uma que eu valorizo mais” pois não se segue desse fato que o texto seja bom. Na verdade tem mt texto em revista boa” que é merda, então sei lá, talvez essas avaliações sejam arbitrárias.

Acho que é muito importante (de um ponto de vista ético? Terapêutico?) que se desvincule o que fazemos dos juízos explícitos sobre o que fazemos. Tendo a achar que um indicador mais sólido do que fazemos está menos no que nos dizem e mais em como reagem (se põem a falar, por ex).

Falo isso pq não costumo receber elogios ou quando recebo eu sinto que eles são ou falsos ou por polidez — já que de fato tento ser alguém simpático, então é o mínimo (e parece que é impossível verificar). Mas acho que tem um ponto positivo: pois acreditar elogios parece cilada.

Acho que é uma cilada pois cria uma régua de mensuração difícil? E torna o fracasso mais difícil de suportar, o que poderia levar a uma incapacidade de lidar com as suas limitações e sem essa capacidade não me parece haver espaço para melhora (enfim, eu sou brega e otimista)


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