May 18, 2022

A crítica de Simondon ao hilemorfismo

A crítica ao hilemorfismo que o Simondon faz no primeiro capítulo de A individuação” é pra mim um dos grandes momentos de crítica ideológica/crítica materialista da história da filosofia. Uma espécie de marxismo que é tanto melhor por ser totalmente (ou parecer) involuntário.

Basicamente ele diz (com uma elegância que invejo e que não é tão constante nos seus textos): só é capaz de pensar que as coisas surgem a partir de uma forma ativa que é aplicada numa matéria passiva quem nunca teve que trabalhar uma madeira antes de construir um móvel qualquer.

Pra mim tem um ponto fundamental pra se pensar a própria filosofia: só acredita na imaterialidade das ideias” quem nunca esteve em situação de ter que comunicar suas ideias (quem nunca saiu de sua própria cabeça ou esteve em circunstâncias em que precisava dialogar com outros).

May 17, 2022

Um estranhamento com Althusser

As vezes sinto que Althusser é pra mim um dos autores mais impenetráveis dos franceses. Não tanto pela sua forma de escrever ou seu jargão. Mas parece que não faço parte do mundo dele em alguma medida (ou ele não é do meu, o que me impede tratá-lo das formas habituais que faço).

O que é ainda muito esquisito, pois ele navega em terrenos muito familiares para mim, com problemas e questões que me parecem muito próximos e que deveriam me fazer sentir em casa. Mas não, quando leio ele sempre sinto que me falta uma peça pra compreender ele, pra fazer sentido.

A forma mais simples de descrever essa situação seria dizer que me escapa (sempre me escapou, isso é meu drama particular miserável) o que ele vive em política. Como se o que aparecesse aí fosse a minha (permanente) incapacidade de me sentir como engajado politicamente.

Ao mesmo tempo me parece que isso é um golpe de vista, já que não apenas essa ideia de engajamento é uma idealização tosca (ainda que do tipo que me deixa do lado de fora enquanto outros estão dentros”), como também me parece que perco a oportunidade de entender porque ela cola.

Assim, o que é escondido” quando digo que sinto que Althusser é de outro mundo é que algo nesse mundo” (mas qual?) me faz sentir como se estivesse sempre aquém de participar nele (como se eu estivesse fora, correndo atrás). Mas se isso for o caso, nunca estive em outro lugar.

Em alguma medida acho que ler Althusser” é algo que me obriga a me sentir constrangido, como se por um instante me fosse revelado de que certas distâncias até podem existir mas elas não implicam o que imaginava. Como se o que aparecesse ali fosse uma forma cômoda de me situar.

Cômoda pois no fim das contas enxergar as coisas por meio dessa distância acaba muitas vezes apagando desejos que não gostaria de ter (nem sempre, pois parte da ilusão me parece também nivelar tudo em uma passividade que adestra mais pela ilusão de se estar perpetuamente parado).

O que parece então estar escondido aí é de fato um desejo de estar à parte, nesse mundo alheio despolitizado. Um desejo que me impõe a ideia de que eu precise correr atrás para que eu de fato não precise me ocupar com o fato de que já estou aqui.

Parece uma forma bastante eficaz de satisfazer ao mesmo tempo o desejo de me implicar politicamente (pois estou indo atrás) e também de me desimplicar (já que desde o início me enquadro como estando de fora).

Mas de novo, acho que o constrangimento que Althusser me traz é justamente pela sua familiaridade, como se a leitura dele me forçasse a perceber que de alguma forma isso está ali, que esse esforço está presente criando uma distância que não quero ver pois vai contra mim mesmo.

O que talvez não seja outra forma de dizer que a leitura de Althusser bate em mim desse jeito por me pegar no pulo do gato entre dois desejos, revelando uma tentativa de solução que, porém, não assumo abertamente por não estar satisfeito com esse compromisso específico.

No fim é como se eu não entendesse o que ele fala por coincidir com seu ponto de vista. Assim como não posso me enxergar (“eu é um outro”), também não conseguiria ver quem ocupa a mesma posição que eu — e que portanto só pode aparecer de maneira estranhada em imagens refletidas.

May 16, 2022

Um distanciamento dos filósofos centrípetos

Eu penso assim nunca mais vou querer mergulhar na obra de um filósofo que não conheço” aí eu leio algumas frases, leio uns parágrafos, fuço a obra e quando vejo já estou caidinho de novo.

A minha forma de me relacionar com filosofia é uma dupla torção da minha maneira de me relacionar amorosamente.

Curioso também que eu me afastei (fora uma lembrança nostálgica da importância na minha formação) dos filósofos centrais para a minha monografia (Barthes), dissertação (Nietzsche) e tese (Deleuze).

Pensando sobre o porquê de ter me afastado desses filósofos. Acho que não é simplesmente o fato de suas teses” me desagradarem (foda-se teses”). Acho que tem mais a ver como a escrita deles me parecer muito centrípeta (sobretudo Deleuze), condenando a uma repetição desviante.

É como se a força autoral deles fosse tão elaborada, tão sistematizada” (mesmo que com diferenças), que fosse muito difícil escrever a partir deles sem dizer a mesma coisa (o mesmo jargão) e não dizer nada (rolar na grama) ou explicá-los eternamente sem fazer outra coisa.

Em certo sentido, acho que eles não me davam espaço para fazer outros problemas surgirem (não necessariamente os meus” problemas, pois acho que também não é isto que me incomoda, e sim uma limitação de quão maleável é o ponto de vista a partir deles).

É o oposto do que eu encontrei em Platão (e por isso pra mim o Platão é uma certa forma um ponto de inflexão na minha formação, algo que representa uma quedra com uma série de expectativas e ideias), já que ele é um autor que me permite tratar qualquer coisa.

May 12, 2022

Esboço da história ferriana da escrita

Chegando à conclusão (Sérgio Ferropilled) que qualquer variante de livre-pensador” (filósofo, humanista, literato, poeta, ensaísta) é apenas um tipo de atividade que se autonomiza (em parte) e obscurece sua relação com os outros trabalhos envolvidos na produção de texto”.

Acho que fico curioso com entender a história da escrita não apenas como uma arte” do bem escrever” (embora exista) mas como uma atividade que envolve vários tipos de trabalho que acabam produzindo aqueles objetos que identificamos como textos.

Isso incluiria o trabalho dos escribas na antiguidade, dos copiadores (muitos escravos?), dos livreiros (onde se faziam as cópias do livro e não apenas vendiam, tradutores, dos editores, tipógrafos, dos monges copistas, da massa proletária atual das editoras modernas.

Incluiria também aquela enorme quantidade pessoas que escrevem textos não-livres” que são feitos em quantidades inumeráveis para as mais diversas finalidades (escritores de textos técnicos, escritores de materiais didáticos, escritores de leis, dos documentos mais variados).

Não acho isso um trabalho simples, mas sinto que talvez encarar a produção textual” do ponto de vista da organização” desse objeto pode jogar um pouco de luz sobre o que é esse campo para além dessa circunstância atual em que vivemos em que escritores são tidos como gênios”.

Não era minha intenção inicial (visto que foi um texto bem circunstancial), mas comecei a pensar nessas questões aqui nesse texto, onde acho que aparece (ainda que marginalmente e sem ser nomeada) a questão do que seria uma escrita comunista”: https://metacomentarios.substack.com/p/alguns-comentarios-sobre-o-futuro?s=w

May 10, 2022

As socializações da filosofia universitária nacional

Contemplando se valia a pena ir ou não à ANPOF esse ano eu concluí que a irracionalidade do campo institucional da filosofia na conjuntura universitária atual somado ao meu percurso específico no campo tornam inviáveis minha participação contínua nesse campo.

O campo é conposto por uma série de práticas de socialização entre os pares que os tornam reconhecíveis entre si (formação, trocas acadêmicas, participação em congressos, escritas de artigos). Todas essas práticas são avaliadas explícita ou implicitamente nos processos seletivos.

Esses processos não são homogêneos. Cada processo seletivo pesam a mão sobre alguns elementos específicos (se você é produtivo, se as pessoas da banca [sem má fé ou corrupção] conseguem ler seu perfil profissional, se você tem uma erudição visível e organizada etc).

Esses processos são importantes pois o acesso a uma emprego é que permite que o profissional consiga continuar no campo. Asim, trata-se da forma que a própria instituição filosófica reproduz a si mesma (inclusive por meio de uma seleção dos traços reconhecidos como relevantes).

Isso não me parece um problema em si. Acho que é natural que todo campo acabe construindo voluntaria ou involuntariamente o conjunto de procedimentos que elege a imagem que esse conjunto/campo quer ter de si (ainda que ele possa se surpreender com os resultados).

A questão é que esse conjunto não é homogêneo. Há interesses conflitantes que tornam ele mais aberto e permeável (ainda mais quando aparece uma reflexividade política sobre o próprio campo, sobre seus fechamentos). Isso permite ele ser mais aberto à mudanças que o re-estruturem.

O campo da filosofia, como falei, é composto por aqueles procedimentos que cultivam” os pares, formam suas subjetividades. Esse campo, porém, não se estabelece num vácuo. No Brasil ele é ligado a uma série de procedimentos que estruturam o acesso à burocracia estatal no país.

Isso faz com que certos procedimentos que estão em vigor não respeitam a lógica do campo, mas ao conjunto maior no qual esse campo se inscreve e que nem sempre tem os mesmos interesses que os do campo (mesmo que lá dentro os interesses sejam variados).

O efeito, como sabemos (e como a @thairw comentou sobre concursos) é que além das regras internas, os postulantes ao campo precisam se adequar à regras externas que acabam muitas vezes diminuindo o pool” de candidatos ao campo. Torna-se caro fazer parte desse campo.

Não cabe entrar no mérito do porquê das regras desse conjunto maior rerem sido estabelecidas (como as demandas de idoneidade” que muitas vezes parecem produzir mais problemas que soluções), mas apenas verificar que isso produz descompassos.

Isso cria um impasse, pois entrar no campo, permanecer nele, acaba dependendo de elementos internos ao campo e externos. E cada uma dessas demanas vai se tornando cada vez mais pesadas e tornando o cálculo sobre a capacidade de permanecer no campo mais difícil.

Além de avaliar se você cumpre os requisitos internos, é preciso cumprir os requisitos externos. Claro, isso é algo que parece pouco, mas a questão é que os requisitos externos geralmente se traduzem por uma capacidade de você se bancar financeiramente enquanto não está dentro.

As necessidades de viajar, de pagar por hospedagem, de ter tempo de estudarem para dar conta de demandas impossíveis dos concursos públicos (como a estrutura de sorteio, que é algo que vem de fora do campo, mesmo que por status quo) vão criando uma situação contraditória.

Você precisa ser capaz de já se bancar para poder continuar a reprodução dentro do campo. Sabemos o que isso acaba selecionando na maior parte das vezes né. Bem, nessas horas então o cálculo começa a cada vez menos valer a pens, já que você começa a ter um custo pra entrar.

Num momento em que os recursos apertam, isso torna ainda mais complicado, já que a ausência de financiamento faz com que apenas as posições mais consolidadas de dentro do campo tenham força para se instituirem como demandas. O campo se torna mais homogêneo.

Na prática isso significa que os critérios internos se tornam mais inflexíveis, os candidatos precisam cumprir todos os requisitos e (imagino que na média) os perfis vão se homogenizando. Isso é um problema na medida em que nem todos os candidatos atendem integralmente ao campo.

O que isso significa na prática? Que pessoas mais desviantes da norma vão ter mais dificuldade de ingressar no campo. Quem atende apenas alguns dos requisitos fica na berlinda pois supunha que era possível contar com uma certa variabilidade dos processos seletivos.

Mas isso não é uma régua de qualidade. Quem tá fora e quem tá dentro não me parece pior ou melhor. Tratam-se apenas de percursos singulares diferentes que são mais ou menos reconhecíveis como pertencentes a um campo. Quando o acesso diminui, quem tá mais longe se fragiliza.

O campo vai ficando mais rígido como consequência e sabe-se como isso até cria um perigo para sua perpetuação. A ausência de novidade estagna e torna tudo apenas mais do mesmo (não acho que estejamos aí, mas há um risco).

Ainda assim, essa situação, esse conjunto de limitações me parece que exigem de quem vai participar do jogo que reflita sobre sua posição, sobre seu percurso, sobre suas escolhas (e o que tá implicado em cada escolha para além das decisões imediatas).

As vezes não se quer participar do campo de tal forma, algo duro de admitir (e por isso você nunca se importou de socializar tanto, ou de construir uma erudição ou seja lá qual o elemento que você preferiu deixar de lado por voltar sua atenção para outras coisas).

Essa avaliação é difícil pois além de pessoal e singular (cada pessoa sabe do seu percurso e ninguém ganha estrelinha por ser mais ou menos legível no campo), ela implica se deparar com contradições no seu desejo, no que você quer, onde você quer ficar.

Em algum momento é preciso assumir o que se escolheu (e que esteve escolhendo). No meu caso trata-se de ver que cada vez menos a carreira acadêmica estrita” faz sentido (o que não significa abandonar tudo, pois as coisas não são simples, mas regular as ênfases e prioridades).

Isso não tem a ver com ser melhor ou pior (repetindo pra mim mesmo para afastar tanto a insegurança quanto o narcisismo), mas com entender as condições em que as instituições se desenvolvem e sua capacidade de se relacionar com elas. Até quanto é possível ceder sem se ceder?

Até um tempo atrás esse cálculo fazia sentido pra mim (compensar meu desejo com o que acho que a academia exige de mim ao ser capaz de atender algumas das demandas específicas). Hoje as condições mudaram e sinto que teria que abdicar de mim mesmo de forma que não consigo.

Considerando que há também nessa equação um custo pra jogar o jogo (como a dinâmica paga dos concursos evidencia, mas não só isso), não me surpreende que cada vez menos esteja disposto a tentar coisas. Simplesmente tem feito cada vez menos sentido.

Nada disso sem sofrimento, claro, não só pelo desejo de ter um trabalho, mas também pela alegria que é você ser reconhecido pelos pares (institucionalmente, já que pessoalmente me sinto reconhecido graças a deus). Assim, não é algo que você deixa de desejar da noite para o dia.

Mas enfim, não tem muito o que fazer né? Chega uma hora que você cansa de dar murro em ponta da mesma faca. Ainda que isso não se traduza em sucesso, é bom conseguir encontrar outras facas para bater para variar um pouco.

May 9, 2022

O impacto da leitura de Platão

Escutando Cavell e pensando como tudo mudou bastante na minha cabeça nos últimos quatro anos. De certa maneira a leitura que fiz de Platão entre 2019-2021, depois do fim da tese, foi algo que me ajudou a construir outra relação com a filosofia de uma maneira muito doida.

É como se depois de todo um percurso institucional (certamente apressado, emendado, por necessidades de trabalho) essas leituras tivessem criado uma distância, um antes e um depois, entre como me relacionava (me relaciono) com esse conjunto de textos chamados de filosofia.

É algo muito esquisito, pois é como se de repente (embora sei que não foi algo nem de imediado e nem total, visto que alguns tiques permanecem) uma série de coisas do campo se mostrassem irrelevantes, desnecessárias, exageradas e até desviantes do que queria fazer.

Claro que isso não foi novidade total. Muita coisa já era cansativa, muitas coisas eu já não tinha disposição pra fazer. Mas depois dessas leituras é como se outra vida tivesse começado e eu sentisse que não precisasse aguentar essas coisas cansativas.

Mas isso não foi tudo, pois a experiência não foi apenas de ordem negativa. Se fosse eu acho que não haveria distância, apenas um ressentimento ou uma amargura (que certamente existem, já que é impossível eu não ter me amargado com o que aconteceu nesses últimos anos).

Em alguma medida é como se também eu passasse a conseguir ver as coisas, ver problemas, ver ideias e conceitos de uma forma nova, fresca, como se fosse uma primeira vez que eu finalmente fosse capaz de ter calma e paciência para apreciar o que e como esses textos fazem.

E nessa hora o que vi e passei a ver (e que acho que em alguma medida é o que persigo, o que tenho buscado, ainda que com altos e baixos, com desvios inúmeros pelo caminho) é um certo impulso de organização e ordenação das próprias ideias, dos conceitos e das conversas.

É como se ficasse mais claro (em um sentido existencial de sentir, sim, agora vejo!”) que em muitos momentos o que interessa é menos entender qual doutrina”, qual filosofia” é a melhor, a mais adequada”, a mais precisa” e sim conversar e costurar algo que produza sentido.

É por isso que eu sempre volto pra uma certa passagem do Mênon em que Sócrates explica o que é a dialética. Trata-se da arte de conversar com amigos a partir do que eles já compartilham. Conversar para construir e entender o mundo que os cerca, para mapear suas distâncias.

Foi isso, esse movimento (de certa forma apresentado de maneira inocente, leve, serena!) que a leitura de Platão me fez descobrir.

O engraçado é que esse movimento também tem tido como efeito aprofundar a minha crise com a filosofia. É evidente que boa parte da minha crise tem a ver com a questão do mundo do trabalho, com as dificuldades de me inserir (e realizar expectativas cultivadas em outra era).

Mas não acho que é só isso. Se fosse só isso com certeza a minha amargura teria me dominado completamente (não digo que ela não esteja bastante avançada, pois está!). Acho que há também um deslocamento de ponto de vista que deixou mais visível meus desconfortos com o campo.

Desconfortos com não saber meu lugar, com ter dificuldade de saber o que fazia, com me sentir de alguma forma sempre à deriva, sem entender bem pra onde ir e com um medo terrível de que eu estava sendo uma pessoa volúvel (de que ler várias coisas significasse ser volúvel).

Acho que nesses últimos anos, esse outro ponto de vista tem me ajudado a entender também que existe um campo. Que existe um conjunto mais ou menos aberto do que é a filosofia, como uma estrutura (como muitas outras) que produz seus reconhecimentos e estranhamentos.

E o que tem sido pra mim bom (ainda que me causa medo) é me reconhecer cada vez no lado de fora dessa estrutura (algo que acho que é importante sobretudo dado a dificuldade do campo em termos de trabalho).

Mas não acho que se trata aqui de um fora heróico” no sentido de eles não me reconhecem” (embora claro, haja sim um desejo de reconhecimento, de querer participar, ser como, estar junto). Acho que é algo mais, insisto, sereno, mais tranquilo, mais de estar em paz comigo.

Foi só com o passar dos anos (desses últimos quatro) que pude ir percebendo que as escolhas dos últimos 14 anos (incluindo esses quatro) já eram em alguma medida uma escolha pelo caminho que tenho tomado e que tomo as vezes com muito medo por conta das incertezas que o cercam.

O que significa aceitar (com o lado bom e o lado ruim) que tem certos limites que não estou disposto a ceder (que não estive, e por isso me encontro aqui). Talvez em uma outra janela histórica (de quando comecei esse percurso), seria possível, mas agora vejo que não.

Quer dizer: agora vejo que uma certa janela histórica (uma certa perspectiva de promessa do começo dos anos 2010) teria me permitido continuar vivendo uma certa desilusão de que pertenço a um campo que não desejo tanto estar junto a ele.

O que é estranho pra mim, e que acho que ainda embola as coisas pra mim, é que esse campo é também o campo responsável por cuidar, cultivar e reproduzir esses textos que tem sido a minha paixão pelos últimos 14/15 anos, que tem sido um dos centros da minha vida.

Então talvez seja mais nesse impasse que eu me sinta agora. Um pouco mais tranquilo como me ver ao lado” da filosofia. Como entender que certamente não vou contribuir com esse campo da forma como ele se organiza atualmente, como ele respira e se desenvolve nesse momento.

E, mais importante, entender (e isso demorou e por isso doeu tanto ao longo dos anos) que não é da ordem dos meus desejos isso (mesmo que consiga um emprego, pois não é sobre isso! — e inclusive muita gente que admiro e acompanho me parece se encontrar exatamente nessa situação).

Talvez seja um problema menor, um problema mais bobo buscar saber como lidar com esses textos estando ao lado” (o outro também era, mas eu sou lento e acho que também existe uma distância enorme entre entender na ordem das razões e entender na ordem da existência, digamos).

Ainda assim acho que é o problema que me ocupa agora, que me tem, aos poucos, me deixado mais animado (ainda que muita coisa ainda alimente a amargura, a tristeza e o cansaço).

Por isso que acho que agora me vejo perguntando: como ocupar esse espaço ao lado do campo sem ser dominado por um ressentimento? Como lidar com essas coisas sem recair tampouco numa postura heróica, de reproduzir a história de uma pensamento marginalizado” (não é dessa ordem).

Se isso parece um problema menor, ou talvez muito específico, é porque em alguma medida essa questão se relaciona (aos poucos vejo) com meu desejo por amizade, por conversa, por criar laços. Ou melhor: trata-se da maneira como sou levado a pensar esses temas e desejos.

Mas enfim! Não é algo que acho que vá conseguir responder por agora pois, mais uma vez, não é algo dar ordem dos argumentos”. Ainda acho que vou precisar quebrar bastante a cabeça no percurso (e também me machucar e me alegrar) até poder entender como isso vai se desenrolar.


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