July 18, 2020

Um certo balanço de desejos de pesquisa

Por um lado eu fico feliz de não ter o que escrever, de não ter nenhuma ideia, nenhum plano de escrita a longo prazo. Por outro lado dá uma saudadinha de ter uma obsessão assim com alguma concretude (só as obsessões usuais e dispersas).

Gostaria de ter tempo para ir juntando as peças de algumas ideias de alguns problemas específicos (sobretudo sobre metafilosofia). Mas tudo distante demais de ter qualquer forma concreta (pelo contrário, parece que se tornam cada vez mais vagas ou mais imprecisas com o tempo).

O meu único objetivo a longo prazo seria conseguir escrever o que eu gostaria de ter feito na minha tese mas acho que tinha ferramentas impróprias demais (e tudo bem). O tema seria algo do tipo: O que sobra pra filosofia hoje?”.

O problema é que pra responder essa questão eu acho qeu acabei me metendo em alguns buracos, tanto que não tem nenhuma síntese à vista fora algumas palavras de ordem (que acho que até me acompanham desde a tese: como navegação’, transformação’, mas acrescidas de um platonismo).

O interesse por entender o mundo ateniense da gênese da filosofia ática passa por aí, por tentar entender as condições em que um tipo de prática discursiva transformadora (que é a filosofia enquanto platonismo) emerge e se desenvolve de modo a ser autonomizável de contextos.

O interesse pelo problema do amor tem a ver com a posição existencial desse tipo de prática. Pois eu acho que de certa forma (uma dica que veio de uma palestra do Maniglier que vi no YT faz mts anos) o problema erótico é um traço fundamental do que nos faz prestar atenção’.

Os interesses difusso pela instituição da filosofia, pelos seus laços institucionais e sociais (tanto históricos como nacionais) é pra entender como as formas de organização de um determinado campo acabam produzindo tipos de discursos diferentes e potenciais diferentes pra fil.

Por isso que acho que sempre retorno pra situação da filosofia atual’. Tem algo de tentar entender e quebrar a cabeça sobre como o caráter existencial’ da filosofia é coibido. Ainda que certamente não seja mais possível fazer filosofia como Platão ou Sênecas da vida faziam.

O que leva ao meu campo de interesse que menos dou atenção, infelizmente, que é uma tentativa de entender como justamente os desenvolvimentos históricos e sociais acabam impedindo que a filosofia repita sem tirar nem pôr suas formas iniciais (ao menos iniciais na Grécia).

Daí um interesse difuso por entender os efeitos da modernidade (entendido aqui como o movimento de globalização que se intensifica com as grandes navegações) mas também as condições específicas aqui no Brasil, na maneira como certas impotências da fil ficam mais visíveis aqui.

July 10, 2020

A aparência de interioridade nos diálogos platônicos

Uma hipótese sobre os mistérios platônicos: acho que o véu que encobria os ensinos orais acabava encobrindo que não havia nenhum ensino na filosofia platônica (ensino cono transmissão de conteúdo). Daí o desconcerto dos diálogos: não há nada a destrinchar ali, a identificar”.

A aparência de uma interioridade pelo caráter supostamente críptico dos diálogos, de uma mensagem cifrada para os iniciados seria antes sinal de que não haveria nada ali no seu interior fora o movimento de tateamento das formas, daquilo que resistiria às análises.

July 10, 2020

A ambiguidade do antiutopismo

Pensando em algo que o @umtoquesutil falou ontem, e tenho a impressão que o erro de alguns críticos (mas não dele) é inverter causa com consequência, atribuindo culpa a certos filósofos/pensadores ”relativistas”” quando eles são mais efeitos que causas.

Que há uma certo desconfiança com valores grandes, com ideais, utopias, que há uma abertura maior pra relativização (não relativismo), que se encontre a verdade das relações e se projete menos, tudo isso me parecem conquistas ambíguas da geração de pensadores pós-guerra.

Ambíguas pois por um lado é indubitável que muitos problemas foram corretamente avaliados, muitos eurocentrismos invisíveis foram efetivamente explicitados e muitas relações de poder arbitrária no saber foram expostas. Isso de fato é fundamental.

O que venho pensando, porém, e aí entra a ambiguidade, é que em parte isso é também fruto de um momento em que essas questões já vão acontecendo, já vão se afrouxando. Que a crítica aos universalismos tem aconteceria em um momento que é propício pra isso. E isso não sem custo?

Acho bobo dizer que a geração da virada linguistica (seja anglo, seja francesa, seja alemã) seja causa dos males do mundo. Mas acho que tem algo ali no mundo que acaba propiciando que nesse momento esse tipo de pensamento vingue mais. Nesse sentido eles expressariam o mundo.

O que não significa que o trabalho deles deve ser descartado. Pelo amor de deus. Acho apenas que estamos num outro momento (e também nunca estivemos na europa/eua), com outras questões e que ideias (incipit Platão) não precisam ser do tipo apenas do mal”.

Inclusive eu devia ler isso faz tempo, fico apenas postergando, mas de tanto ouvir dizer a impressão que tenho é que uma das paradas massa da revolução haitiana é justamente a coisa ser construida também em cima de ideias? (Mas enfim, sou ignorante sobre isso, preciso estudar).

July 7, 2020

Um caminho para estudar a relação entre Deleuze e Badiou

Como isso não vai acontecer tão cedo vou desovar aqui uma ideia (que tava matutando com o @gtupinamba ) e que alguma boa alma pode pesquisar: Entender a relação entre Deleuze e Badiou do ponto de vista inverso. Não ver como Deleuze afetou Badiou, mas como este influenciou aquele.

Se a gente leva a sério o relato de Badiou sobre a reaproximação pessoal que eles tem nos anos 80 (e que passa por uma refamiliarização das obras de um e do outro) e que eles estavam discutindo o problema da multiplicidade entre eles, me parece que há algo a ser investigado.

O caminho que eu faria seria voltar pros capítulos 4 e 5 do Diferença e Repetição (onde Deleuze respectivamente define o que é a diferença e descreve o processo que constrói identidades) e comparar com a relação entre conceito, multiplicidade e acontecimento em O que é a filosofia?”.

Verificando uma possível divergência (e acredito que há, como há divergências e ajustes ao longo de toda a obra de Deleuze, apesar de ela ser repetitiva), caberia uma análise do Ser e Evento e também — como intermediário — uma leitura de A Dobra e da resenha de Badiou do livro.

July 6, 2020

O acadêmico hipster acumulador

Um tipo acadêmico que me incomoda muito é aquele que une a sanha acumuladora com um hipsterismo e um moralismo. Ninguém pode abrir a boca (moralismo) sem ter lido todas as referências (acumulador) que curiosamente são as mais marginais que eu’ domino (hipsterismo).”

Eu até sou um acumulador, mas tento dizer pra mim mesmo que isso é uma patologia minha que não deve ser cobrada de todos (nem sempre consigo, claro — fico sempre na dúvida sobre as ocasiões em que não sei dizer se sou eu que tou exigindo ou é a matéria trabalhada que exige refs).

Por ex: acho ok exigir que alguém que vá falar >profissionalmente< da leitura que Deleuze faz de Nietzsche ou Kant tenha se dado o trabalho de ao menos ler Nietzsche ou Kant (sem precisar ser especialista). Mas não parece razoável exigir que se conheça toda filosofia alemã para isso.

Outra coisa que acho fundamental mas por implicações éticas: se alguém fala mal de algum autor e você compra isso sem ir no autor, sem avaliar você mesmo o mérito. Você comprar essa briga, propagar a crítica à distância (tendo tido pouco ou nenhum contato) acho bem complicado.

É diferente de ler uma crítica, absorvê-la e achar que aquilo não é para você e não lidar com aquele autor. Agora pegar essa crítica (e outras) e tornar em cavalo de guerra sem que você se dê o trabalho de ir no autor criticado me parece complicado.

July 2, 2020

História da filosofia e seus heretismos

A história da filosofia acaba virando uma caça pelos momentos heréticos, pelas passagens condenáveis. Eu suspeito que isso no fundo tem algo de ser uma forma de tentar lidar com o fato de que o sujeito se vê implicado na filosofia (aquilo é uma paixão) mas observa seus limites.

Tem que passar pano pra filósofo não (embora não vou negar que eu acabe passando mt), mas acho uma loucura esse espírito acusatório responsabilizador. Acho que esse tipo de espírito inclusive é algo bem semelhante ao olavismo, a crença de que no fundo a filosofia manda no mundo.

Mas o Badiou no primeiro capítulo do Manifesto pela filosofia” aponta de modo muito SAGAZ a armadilha que os filósofos constroem para si mesmos. Se põem uma tarefa impossível de pensar um impensável” e diante desse fracasso acaba-se condenando a própria filosofia.


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