July 15, 2021

O public scholar” no Brasil

Vocês acham que existe aqui no Brasil um espaço para public scholar”? Tou vendo uma zoom-aula agora da Merve Emre (que parece que está escrevendo um livro sobre isso) e parece que no Brasil ou você tem o intelectual tarimbado ou você tem jovens fazendo divulgação científica”.

O que tou dizendo é que parece que quem é acadêmico ou acaba seguindo o caminho tradicional do especialista (pois é o que permite ter espaço na academia) ou (pra ter espaço) precisa já ter um tempo de estrada para ter direito” de pensar.

Ela tá comentando (sem necessariamente elogiar ou criticar) sobre como tem tido uma mudança nas teses em humanidades anglo em parte por transformações do mercado lá (cada vez menos espaço de professor estável). O que não significa que o mercado do intelectual público seja bom.

A gente até tem uns espaços que em tese são pra isso (Suplemento PE, Piauí, Serrote, Rascunho, e sei lá qual você quer, inclua qualquer coisa). Mas 1) parece um misto de (na maior parte das vezes) resenhas de literatura (que podem ser boas) ou coisas que são sempre introdutórias.

E nem acho que é uma questão que se resolve simplesmente com a abertura de revistas novas (“novos mercados”), pois acho que o problema é justamente o mercado (nem se forma profissionais para isso, nem se pagam os envolvidos nesse processo — não de maneira generalizada).

Fico pensando que o desafio é também conseguir pensar uma forma que isso seja possível sem que se acabe apenas desenvolvendo *mais um star-system* (mas de pjotinhas em vez de professores concursados).

July 10, 2021

Sobre ser (ou se achar) volúvel

Apesar de isso me atrapalhar bastante em muitos sentidos, confesso que gosto de ser uma pessoa extremamente volúvel que muda de interesses a cada cinco minutos.

É ótimo também para ter sempre junto de você a ideia de que você não sabe de muita coisa e que o que dá pra fazer é só ir deslocando seus pontos de vista.

Tem outra coisa também que eu acho legal (mas que não tem muito como provar, pois no fim das contas não é algo que depende de você), que é uma certa disposição pro que o outro tem pra te mostrar. É legal, você aprende bastante coisa simplesmente da consideração séria dos outros.

Não sei explicar o que seria assumir” essa posição (pois não parece um gesto voluntarista’), mas acho massa. Inclusive acho que a forma de conseguir se orientar à partir dos excessos é justamente um em que se abdica da posição de ser a figura orientadora.

July 9, 2021

Um elogio ao gueroultianismo IFCSiano

Hoje tava lembrando da minha graduação e o professor que mais me formou e influenciou — sem que ele saiba ou tenha ideia de quem sou — foi um professor de Kant. Não eram aulas inesquecíveis”, mas elas tinham uma consistência e minúcia que (enquanto graduando) me marcaram.

No fim das contas acho que tanto na forma de ler os textos, como também no jeito de ensiná-los por meio da leitura, eu estou apenas repetindo o que via nessas aulas.

Um estilo de aula que eu descreveria por gueroultianismo vulgar ou medíocre (isso é um elogio!). Um apreço ao caráter sistemático do texto que aparece em cada etapa, mas sem terminar nas paranóias gueroultianas. Também uma consideração do contexto sem se perder em redes de referência.

Os únicos arrependimentos que eu tenho do IFCS e da minha graduação é não ter assistido mais aulas de dois professores em particular. O resto eu realmente acho que não tinha muito como fazer melhor com o que tinha à disposição na época.

July 9, 2021

Comentários sobre o departamento ultramar de Paulo Arantes

Não é nem que eu concorde (ou discorde), mas eu adoro esses momentos que o Paulo Arantes desliza da pose e trai seu gosto pela filosofia (no caso explicando aqui [no livro Um departamento francês] o rendimento possível de um estudo filosófico focado em historiografia).

Não sei que drogas que as pessos tomaram pra achar esse livro uma grande apologia à usp (se você está fora dela) ou uma ofensa à usp (se você for uspiano. Uma pena, pois meio que deixa invisível o esforço de ir mapeando pontualmente algumas tendências que apareciam lá.

Claro que o tom memorialista em alguns momentos não esconde a saudade do autor pela sua juventude. Ele mesmo está bem ciente disso e não esconde. Mas achar que disso significa que tudo o que tá ali é da ordem do elogio ou, pior!, uma defesa cega me parece um pouco exagerado.

O que eu tiro desse livro é a tentativa de pensar e explicitar as relações institucionais que configuram as reflexões filosóficas (com toques mais ensaísticos-memorialísticos do que quando aplicados ao campo alemão e francês).

July 9, 2021

A estranha libertação da filosofia

Eu acho interessante as justificativas que o Paulo Arantes dá para valorizar a disciplina do historiador da filosofia na instituição do campo filosófico nacional. Acho que faz sentido. O problema pra mim são as patologias que decorrem disso.

ois de fato, esse tipo de prática, ancorado em uma herança do kantismo (que ele retraça muito bem em diversos textos) libera os textos filosóficos de construirem um discurso com referências verdadeiras.

O problema é que uma vez liberado do fardo de ter que produzir verdades, a instituição que possibilitou essa liberdade só permite que essa liberdade” se exerça de uma única maneira: comentando textos de filosofia.

O problema não são os comentários, mas esse ser o caminho dominante possível.

July 8, 2021

A necessidade de um sentido para a formação filosófica das universidades

Qual o sentido de um departamento de filosofia se não existir filosofia no ensino básico? Não digo que eu acho que a filosofia não faz sentido ou que ela tenha que ter uma função útil”. Mas sem o ensino básico não tem razão de existir dessa formação na universidade.

Sem o ensino básico não existe nenhuma alocação profissional para o filósofo. Sem alocação possível (mesmo que existam licenciaturas) a tendência me parece ser os cursos ficarem obsoletos. Dessa forma os próprios professores formadores ficam sem função.

Até se poderia dizer que a filosofia pode ter um papel auxiliar na formação de qualquer disciplina, mas isso nem parece ser o caso de boa parte dos departamentos (que parecem ter horror a lidar com outros assuntos), nem parece ser suficiente para garantir +30 programas de pós.

Dessa forma perdeu-se o bonde (que partiu há cem anos) da universidade como uma unidade sistemática que dá à filosofia a ocasião de ser chanceladora metodológica geral e perde-se também o bonde (mais importante) de uma oportunidade real de emprego para seus formandos.

Eu realmente não consigo entender como isso não é a prioridade número um das grandes forças institucionais (gestoras de recurso) no campo. Parece uma questão de tempo até a estrutura toda derreter.

Eu me pergunto há muitos anos: o que faz um departamento de filosofia ter espaço? O que deixa que eles continuem existindo? Eu imagino que tem ali um elemento de capital social e/ou simbólico envolvido, que permitiu que eles conseguissem perdurar durante um tempo.

Confesso que fico um pouco triste com isso tudo.


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