November 20, 2021

A necessidade de uma leitura materialista da filosofia

Só uma leitura materialista da história da filosofia pode nos salvar.

Contexto: acho que tentar explicar a história do pensamento como um puro jogo de recepções entre pessoas que tradicionalmente identificamos como filósofos acaba sempre ignorando como filosofias transmitidas vão ser sempre recebidas a partir dos constrangimentos de uma época.

Esses constrangimentos não precisam ser negativos, pelo contrário. As situações e os problemas de cada tempo é que vão dar a especificidade da recepção de um pensamento e que vão explicar as variações específicas infletidas na história do pensamento.

November 18, 2021

Uma obsolescência da ética na filosofia

Eu queria entender o meu interesse contínuo por ler textos de filosofia que lidam com problemas éticos apesar de eu não acreditar que a leitura desse tipo de texto ajuda no processo de construção de uma vida melhor. Não entendo mas me fascina demais qualquer obra sobre o bem”.

Eu até acho que a filosofia ajuda na construção de uma vida melhor, mas não acho que é o conteúdo das obras em si que indica um caminho a ser seguido. Minha posição é de certa forma platônica no sentido de que a pergunta pela boa vida opera certos deslocamentos epistêmicos.

Na arguição do concurso fizeram umas perguntas boas sobre esse tema. Um dos membros da banca perguntou (com razão, sobretudo considerando meu memorial) se eu não era um pouco nostálgico com relação à prática filosófica, como se fosse enfeitiçado demais com a ideia da boa vida.

É uma pergunta que faz sentido, ainda mais considerando o quanto gosto de filosofia antiga (mais gosto” do que estudo”) e também como a leitura de Hadot foi marcante pra mim. Ainda assim, acho que o meu problema talvez seja justamente o contrário, seja entender uma distância.

Na hora eu respondi outra coisa, mas pensando agora (pois eu não consigo pensar em outra coisa) eu diria que boa parte do meu esforço é uma tentativa de entender justamente esse desencontro entre o problema da boa vida enquanto pergunta e a construção de uma boa vida.

Me fascina justamente como apesar da filosofia ser uma tradição que se põe esse problema (em inúmeros momentos, de inúmeras formas), que as respostas para essa pergunta não são as resoluções desse problema. A vida boa não se constrói por meio de um domínio das razões para agir.

E isso acho que esse desencontro é intensificado na medida em que as condições de sociabilidade vão se tornando mais complexas (em que a forma de construir uma vida passa cada vez mais pela organização entre diferentes sujeitos).

E apesar de sistemas e estruturas belas serem desenhadas, não parece que o caminho para agir bem é é por meio de uma compreensão das formas de juízo prático, da elaboração das estruturas de decisão, da compreensão da nossa capacidade de agir (e das condições em que agimos).

Mas parece que mesmo sabendo que não é assim que alguém se torna uma boa pessoa, ainda assim parece em alguma medida que essa pergunta faz algum sentido para a boa vida. A resposta platônica talvez seja que essa pergunta conduz a uma reflexão que desloca a própria perspectiva.

Nesse sentido daria pra dizer que a pergunta (e o fato de você identificar a pesquisa”, a investigação” com a possibilidade de se tornar uma boa pessoa) é o caminho inicial para lidar com uma certa insatisfação com a sua própria forma de existir que começa a se deslocar.

Mas ainda acho isso uma resposta insatisfatória. Pra mim ainda não fica totalmente claro porque o problema da boa vida (por mais que ele seja hoje problemático) especificamente vai ajudar o sujeito a se transformar (mesmo que não seja pela resposta dos conteúdos).

November 17, 2021

Vantagens do profissionalismo da filosofia anglófona

Quando eu olho o mundo anglófono filosófico das especializações (em que cada setor da realidade [por mais específico que seja] parece ter um conjunto de filósofos, cadeiras, revistas e congressos) eu me sinto um habitante de outro planeta.

Eu não sei se eu acho ruim ou bom. Por um lado eu gosto do aspecto amador” que a filosofia não-anglófona possui. Por outro lado esse mundo anglófono parece (ao menos em tese) mais aberto a lidar com o mundo fora temas tradicionais como política, arte e ciência.

November 15, 2021

O mito do caminho acadêmico natural”

Amigo meu acabou de comentar de um concurso em cidade do interior, fora dos grandes centros, com 49 inscritos. Eu sei que as pessoas vem com boa fé, mas acho que isso é meio o fim daquela ideia de que tem que buscar locais de fora”.

Isso sem contar a) o custo de viajar para longe de onde se está (os custos vão pra casa dos milhares de reais) e b) o caráter problemático dessa onda de pessoas dos grandes centros ocupando temporariamente” vagas em locais fora de onde desejam ficar até conseguirem voltar.

Nada contra quem resolve tentar esse tipo de coisa (acho que é uma aposta, ainda mais nesses tempos tão difíceis em que a coisa vira literalmente um investimento de alto risco), mas acho que tem que acabar essa história de que há um caminho natural”.

Ainda tem um detalhe muito gostoso vindo no horizonte que é que com a ausência de bolsas de pós-doutorado (e com as exigências de trabalho das vagas de substituto) vai se tornar cada vez mais difícil a dedicação enquanto pesquisador, o que vai aumentar as distâncias competitivas.

November 4, 2021

Donos e parasitas de temas

Não sei o que é pior, as pessoas que se comportam como donos” de certos temas/campos (com todas as ações que seguem dessa postura) ou a pessoa cuja especialidade é parasitar sempre o tema de outros (sempre explorando novas áreas como se ele tivesse sido o primeiro a pisar ali).

O segundo tipo me incomoda pois eu me interesso por qualquer coisa que meus amigos e pares fazem então sempre tenho medo de ser tomado como um parasita. O primeiro tipo me incomoda pois sempre acho que vão ficar enchendo meu saco quando fico fazendo meus passeios.

November 1, 2021

As duas culturas da filosofia contemporânea

A filosofia continental é em termos de organização heróica” (aristocrática?). É sempre uma história de gênios que se superam ou se aliam para tratar de problemas imensos e incomensuráveis. A analítica por sua vez parece democrática, mas os problemas tem tamanho provinciano.

Não quero dizer com isso que a filosofia analítica é menor, mas que ela parece ser um espaço em que cada filósofo é incentivado a inventar sua filosofia caseira” (o que faz com que seja também algo meio filosofia de quintal”). Isso tem seus benefícios, claro.

Fica aí a questão sobre o que seria uma filosofia nem aristocrática (tratando de grandes problemas, próximos de nós, mas sempre a partir de heróis que nunca seremos) e nem democrática/liberal (acessível a qualquer um mas geralmente com questões que não parecem sempre menores).


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