May 3, 2021

Mercado de trabalho e instituições de pesquisa

Se aproximar demais das estruturas de instituições de educação e do modo como elas gerenciam a circulação e desenvolvimento de conhecimento nos discentes produz umas ondas bem fortes de niilismo.

A pior coisa é quando você percebe exatamente o que é concebido como conhecimento’ e educação’ ao ver o que exatamente as instituições procuram transmitir e que tipo de feedbacks elas esperam.

Apenas para esclarecer sem entrar em detalhes: meu problema não é que as instituições de ensino não consigam cumprir as promessas de alocação no mercado de trabalho. Que essa ilusão vai ser esmagada pela ausência de trabalhos é o que se espera.

O que me incomoda é que no processo de não cumprir essas expectativas, de se frustrar com elas, que outra coisa, outro tipo de forma de aproveitar aquele tipo de espaço não apareça. Que a vida das pessoas mude mesmo que isso num tenha rendimento instrumental-profissional.

May 1, 2021

O tempo linear é fetichizado

Tomar a experiência do tempo linear e progressivo como algo problemático em si (e que deve ser desconstruído logicamente ou metafisicamente) é ignorar as relações sociais implicadas nessa construção do tempo (cf. Postone)?

Será que dá pra dizer que um outro efeito do fetichismo da mercadoria é que as relações sociais entre as pessoas apareçam como relações sociais entre os átomos sequenciais do tempo (que tem seu sentido não de sua homogenidade, mas em exprimir certas relações de dominação)?

Pensando nisso também com base no que o Toscano e Kinkle falam do container. Eles comentam como o Container atrai a atenção de artistas e é tomado como abstração real” do capitalismo pela forma concreta homogênea, uniforme, fungível etc que possuiria fisicamente.

O que eles comentam é que isso deixa de lado o ponto em que os containers encarnam as relações sociais do capitalismo: quando seu uso implica desvalorização do trabalho portuário, empobrecimento e distanciamento das regiões portuárias do resto da cidade etc.

O que me pergunto e devo fazer de modo meio bobo (como se alguém tivesse feito isso antes) é se essa questão não existe também nas discussões sobre os problemas do tempo linear”. Claro, capaz disso tudo já estar no Postone e eu não ter me ligado quando li ele.

April 27, 2021

A especialização na filosofia e as condições institucionais do campo

Uma hipótese que tenho pensado bastante é que o tipo de filosofia que se faz e se produz agora está mais atada às suas condições de reprodução do que a disciplina gostaria de imaginar (já que talvez ela imagine seu caráter altamente especializado como fruto de rigor).

Suspeito que com a crise das humanidades nas universidades (menos empregos, tempo e recursos) os elementos materiais que condicionam o tipo de filosofia erudita e especializada que dominam atualmente (e que serve de crivo pro avanço de carreira) vai se visibilizar cada vez mais.

A divisão de trabalho intelectual e manual, a reserva de espaço do professor-pesquisador como intelectual dedicado com espaço pra erudição, a disponibilidade sem precedentes de acesso ao material de trabalho (livros etc), tudo isso parece conduzir a um profissional especialista.

Sob uma espécie de imagem de rigor, precisão e erudição, parece que privilegiou-se mais a troca entre pares internos (o que leva a uma maior especialização e diferenciação interna à disciplina) do que a construção de conversas para além de fronteiras disciplinares.

Mas incluiria como elemento fundamental que ajudou a dar forma à maneira como a disiciplina se organiza (mas que acredito que está mudando) uma certa limitação ou dificuldade recente (desde a 2GM) de como engajar o trabalho intelectual/de pesquisa em lutas emancipatórias.

Não quero dizer que foi uma geração despolitizada, mas tenho a impressão que boa parte da cultura do scholar na filosofia acontece num momento em que formas antigas de engajamento político foram fechadas e novas ainda não se desenvolveram completamente.

A consequência disso me parece ser a perda de interesse e estímulo para conversar com outros campos. Não é que a disciplina se fechou em si mesma porque quis. Acho que tiveram formas de troca com campos (não apenas outras disciplinas, mas outras atividades) que foram barradas.

Também não acho que o fim dessa figura especializada seja o fim da filosofia. Significa que talvez o tipo de coisa que a gente vai reconhecer como filosófico vai começar a operar por outros crivos (e possivelmente crivos menos eruditos). Talvez eu esteja sendo otimista.

Falo isso (e acho que fico insistindo) pois acho que boa parte do mal estar que a gente no campo sente (mas talvez gente de fora interessada também) é o descompasso entre a ideia da filosofia, de uma prática que de modo vago acreditamos que nos ajudaria e sua expressão atual.

Minha impressão é que essa expressão atual (cultura livresca, eruditizada e especializada) tem um lastro que a sustenta como comunidade (a possibilidade/promessa de empregabilidade) que não existe mais como horizonte (e que, aprendemos hoje, nunca existiu de fato).

Sem esse horizonte, que em nossa cabeça poderia em algum momento indefinido resolver alguns dos dilemas que vamos empurrando pra debaixo do tapete (“como tornar acessível esse campo que só se especializa?”), acabamos ficando apenas com o estado do campo atual e seus defeitos.

Ou seja: as hierarquias que perpetuam as distâncias. A meritocracia que aparece apenas como uma análise de quem tem recursos (tempo) para estudar e se preparar/publicar. O desenvolvimento de nichos/igrejas em torno de especializações que só servem pra se perpetuar. E etc.

O mal estar vem então do fato de que nós queremos algo desse mundo, mas não da forma que ele se desenvolve? Talvez eu esteja viajando aqui um pouco mais, mas acho que por isso é preciso remontar às condições do campo pra entender o que está travando e nos deixando frustrados.

April 25, 2021

Pergunta pela eficácia da filosofia

Questões que tenho me feito recentemente:

  1. A filosofia funciona?
  2. em algum momento ela funcionou?
  3. sua ineficácia é uma obsolescência programada ou efeito de transformações históricas?
  4. se ela for ineficaz com seus fins pretendidos, o que se pode extrair dela?

Nota: todas essas perguntas partem de uma espécie de sensação ambígua de que a atividade filosófica tem um efeito real positivo mas que esse efeito nem sempre se adequa às pretensões do discurso filosófico.

Questão suplementar: quais as consequências na filosofia, ou seja, em discursos pretensamente universais (o que não significa homogenisantes etc), quando um mundo materialmente se conecta socialmente (capitalismo)?

Com relação à obsolescência programada o que estou me perguntando é se é da natureza do discurso filosófico que no momento em que ele opera uma síntese interessante é também o momento em que ele se torna perigoso por um narcisismo institucional que toma a síntese como final.

Ainda tem uma outra questão que me atrai demais é que os interesses pela filosofia das pessoas que estão dentro da filosofia e as que estão fora (institucionalmente) parecem ser diferentes. Tem um desencontro entre o que o filósofo acha que tem a oferecer e o que ele de fato dá.

April 25, 2021

O método de órbitas sucessivas

Gostaria de fazer um artigo que demonstre o valor do generalista superficial para poder facilitar minha alocação no mercado imaginário e inexistente de trabalho mas sairia um texto muito superficial que não convenceria ninguém pela ausência de argumentos mais sólidos.

Meu novo modus operandi será descrito nos termos do Osterhammel: successive orbital paths”.

modelo de Osterhammel-1modelo de Osterhammel-1

modelo de Osterhammel-2modelo de Osterhammel-2

April 23, 2021

O pensamento não é o que pensamos dele?

Infelizmente (pois significa que talvez tenha que ler e ver que tou errado) eu acho que estou me aproximando involuntariamente de duas ideias/máximas lacanianas pra formular o que entendo por pensamento.

A primeira seria Lacan sobre amor: que amar [pensar] é dar o que não se tem a alguém que não quer. A segunda seria o que ele fala sobre pensamento e eu’: lá onde há pensamento (inconsciente),”eu” (Je) não estou, e lá onde está o eu”(na enunciação), isso não pensa mais.”

Não é algo que estava procurando, mas sinto que de alguma forma o que tou pensando tá indo nessa direção. Tanto no que diz respeito que o que pensamos é alvo de uma extração de mais-valor pelos outros e que isso tem algo a ver que pensamos justamente quando estamos ausentes.

Mais uma vez, acho que não tem qualquer originalidade aqui, eu tou só lentamente reinventando a roda que foi feita e desfeita mil vezes.


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