August 4, 2020

Quatro tendências da filosofia contemporânea

Queria em conseguir descrever de modo ideal (ou seja, enquanto tipos que não necessariamente se conceetizam) quatro tendências de modos de realizar filosofia que parecem existir atualmente. Mas não é tanto o objeto ou as referências, mas o modo de se pôr enquanto filosofia.

Identifico vagamente quatro correntes cujos nomes devem ser entendidos cum grano salis pois as coisas no mundo concreto são muito mais misturadas:

  1. analítica (eua/inglaterra)
  2. especulativa (frança)
  3. fenomenológica/hermenêutica (alemanha/frança)
  4. historiográfica (brasil)

Lista não exaustiva, mas suspeito que outras tendências podem ser vistas como a mistura. Ainda assim certamente não me oporia a ampliar essa lista. Mas a ideia seria tentar entender como se estruturam esses estilos de pensamento até para entender o que conta” em cada estilo.

O ponto de partida pra isso tem sido o contato com uma galera com formação mais analítica aqui no twitter mas também na vida real, ou seja, é uma curiosidade pra entender que o valor filosófico” de uma ideia se realiza de diferentes formas, segundo diferentes estruturas.

Talvez seja meio bobo ou inócuo, mas sempre fico surpreso sem conseguir entender exatamente como que textos de um Sellars e de um Deleuze e de um Husserl e Bento Prado Jr não sejam imediatamente tradutíveis um nos termos do outro ainda que lidando com problemas bem próximos.

Talvez seja uma limitação minha, mas parece que a infraestrutura de troca nesses quatro casos acaba resultando em formas de exprimir o filosófico completamente distintas, de modo que as interações com esses estilos cada uma tem sua forma sem que qualquer uma seja melhor.

Pensando a partir do que tentei falar aqui, eu acho que as formas de socialidade de cada um desses estilos diverge da mesma forma que uma comunidade vai ter suas regras e procedimentos para gerenciar afetos e/ou relações de amor, amizade, pode, ódio etc.

Isso pra mim faz sentido, já que a filosofia é também (pra mim) uma forma de fazer sentido em conjunto com outras pessoas — nunca sozinha. Não seria surpreendente, portanto, se os estilos se constituissem como demarcações de limites sociais.

August 2, 2020

A comensurabilidade do estilo da filosofia analítica

Essa thread é boa e algumas das interações ajudam a explicar um pouco a minha preguiça com o mundo da filosofia analítica. Não é tanto um problema com os objetos ou com os temas, mas com a maneira como as discussões e as argumentações se desenvolvem.

E nem vou entrar na questão do mérito, sobre que tipo de estilo é mais apropriado (nenhum é, pra ser sincero, a filosofia se define por incontáveis estratégias de procedimento e de gênero). Mas uma coisa que tenho a impressão é que o estilo analítico” é mais comensurável.

De novo, não significa que é melhor ou pior, mas tenho a impressão que ele torna as discussões mais inteligíveis (o que é bom, se a gente não cai no erro de achar que isso não rola em outros estilos) o que por sua vez acaba facilitando na hora de avaliação no mercado de empregos.

Essa comensurabilidade pra mim se vê na maneira como cada coisa, cada ideia, cada método” tem uma caixinha e também como as articulações são e elaborações são muitas vezes postas em termos de refutação e/ou expansão de argumento de outro. É sempre um clima de disputa.

Mas o que me incomoda, além das questões institucionais, além de ser um estilo que se porta muito bem a ser absorvido pelo mercado é a ilusão de que só assim se produz inteligibilidade. Como se só em certos termos se fosse possível elaborar e produzir um campo comum de questões.

Talvez o ressentimento falando — sobretudo por conta das oportunidades de emprego — mas isso acaba produzindo uma má vontade enorme com outras formas de pensar. Não que o meu campo não acabe tendo suas patologias herméticas, mas tomar isso como regra é foda mesmo.

July 30, 2020

Problemas no sistema de publicação na filosofia

Tem questões boas nesse artigo e isso expõe minhas preguiças com filosofia profissional. é a cultura de artigos chatos que ninguém quer ler e que na maior parte das vezes são revisões da literatura ou debates sobre qual a melhor linha interpretativa: https://thepointmag.com/examined-life/publish-and-perish-agnes-callard/

Revisões bibliográficas e disputas hermenêuticas podem ser interessantes, mas se você olha os índices da revistas a maior parte das coisas dá uma vontade de não ler. Sem contar as exigências desse tipo de artigo que acabam sufocando qualquer mobilidade maior que o autor pode ter.

O que me faz pensar um tema que sempre tive vontade de estudar, que é a pergunta pelo gênero literário” da filosofia, já que as práticas textuais filosóficas são as mais variadas possíveis. Mas enfim. Soframos mais um dia com o estado das coisas.

No fim das contas todo artigo acaba sendo igual, pois todos tem que dar conta do estado da arte, todos tem que mostrar todos os detalhes das afirmações e todos tem que ser escritos da mesma forma. Meu problema não é tanto apenas com isso, mas que isso seja a única forma de fazer.

E nem é que eu defenda escritas poéticas (não defendo), mas acho que rola um sufocamento já que a cultura de publicação está atada às chances de conseguir emprego. No fim é como se a gente apenas ficasse fazendo eternamente trabalhos de graduação, apenas cada vez melhores.

July 29, 2020

A jaula da liberdade na era da internet

Eu tenho pensado muito na palavra liberdade” e como num contexto em que as identidades e as personalidades são co-constuídas a partir de uma rede internética deixa isso tudo mais difícil de localizar e entender. E não apenas por estarmos presos aqui (coisa que estamos).

O que parece ser uma jaula é justamente a ideia de que somos indivíduos, que temos autonomias. E impossível não acreditar nessa ideia se constantemente somos bombardeados por informações feitas sob medida” pra a gente. Fica até bobo o que falo mas não consigo fazer diferente.

Parece que o que fica um pouco esquecido é como a nossa singularidade estaria talvez justamente na forma como vivemos a interdependência que temos de outros. Como somos encaixotados por algoritimos só conseguimos enxergar tudo em termos de produtos com arestas bem aparadas.

Daí talvez aquilo que o @toujourmicelio falava mais cedo do modo referencialista de lidar com autores. Sinto que isso tudo é em alguma medida fruto da rede que precisa transformar todos os dados em mercadorias, de modo que é cada vez mais difícil navegar de outra forma.

O problema é que (pra retomar um tema da @irrideo e da @alyne_costa ) quando a crise bate o que acaba revelando é uma espécie de conectibilidade que nem por isso se resume numa totalidade harmônica, de modo que parece que só num vislumbre a gente sente isso e quando sente.

Não sei dizer exatamente o que é essa liberdade ou mesmo verdade que aparece em momentos de crise, mas sinto que tem a ver com uma liberdade dessa vida disposta em mil predicados (como se fôssemos apenas uma soma de predicado). Como se fosse a ideia que não somos apenas isso.

Mas enfim. Agora eu divago. Pois se por um lado acho que essa autonomia/individualidade é ilusória, também não consigo comprar totalmente a ideia de que somos nada ou que somos apenas um produto dos nossos meios. Tem algo entre essas opções que me escapa mas me parece melhor (?)

July 28, 2020

Evitar a auto-congratulação filosófica

Uma coisa que acho que é o ponto mais difícil de qualquer operação pedagógica na filosofia é evitar que ela não se torne apenas uma ocasião de dar um biscoito, que o resultado não seja apenas um prazer meio auto-congratulatório que deixa tudo como está.

Pois é muito fácil (ou mai fácil, ao menos), pegar alguns conceitos da moda, trazer uns exemplos massa e fazer todo mundo ali satisfeito com o que aconteceu sem que nada tenha efetivamente acontecido, sem que algo além de jargões” tenha sido trocado.

Nessas situações o aluno sai munido” do conceito e aparentemente está tudo bem. Mas acho que o problema tá um pouco aí, pois se isso aconteceu — e uma celebração intensa costuma ser sinal disso — talvez ninguém tenha se transformado, ninguém tenha se afetado (e isso é foda).

O difícil eu acho é evitar as armadilhas (pois é bom também ser elogiado, é bom ser valorizado) que façam com que os sujeitos apenas se reafirmem enquanto sujeitos. Isso não é apenas um ponto neutro, isso efetivamente torna mais e mais difícil o trabalho pedagógico a longo prazo.

Zuando Leopardi, Tudo deve permanecer igual para que tudo possa piorar.” Mas é difícil tb pq se é ruim essa prática que o aluno sai ao menos satisfeito (pois reafirmado” enquanto alguém em progresso”), ao menos ali há algum tipo de transformação visível.

É muito difícil, acho, saber se orientar longe disso (ainda mais que não é porque essa satisfação é problemática que o sofrimento” seja A VERDADEIRA PEDAGOGIA — deus me livre), tentar realmente construir uma operação que seja de fato libertadora, digamos.

July 26, 2020

Uma atenção necessária aos procedimentos práticos da filosofia atual

Se filosofia é um uma arte de transformar a vida/existência, como Pierre Hadot elabora, sinto que é preciso triangular melhor a relação entre as técnicas efetivas dessa atividade, a teorização sobre a atividade e as próprias elaborações teóricas que se desenvolve na filosofia.

Atividades concretas como fazer fichamentos, elaborar resumos, operações de crítica ou de explicação de outros textos ainda são artificialmente descoladas demais da atividade quando na verdade énmuitas vezes com base em procedimentos assim que a filosofia acaba acontecendo.


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