July 28, 2022

A tese como espaço confuso de problemas

O lado positivo da minha tese (que é um texto terrivelmente confuso, desconectado, disforme, irregular [com bons insights aqui e ali, admito]) é que de alguma forma consegui nela trazer pra superfície todas as minhas obsessões (ainda que geralmente com as ferramentas erradas).

Volta e meia vejo as coisas que tou trabalhando, e acho que de alguma forma conecta com os problemas que estava tentando elaborar ali. Acho que tem uma imaturidade inevitável ali (pela idade que fiz aquilo, pela minha molequice e por uma arrogância besta), mas serviu pra algo!

Não recomendaria ninguém ler minha tese, não acho que é um trabalho acabado (e nisso invejo demais o trabalho de alguns colegas), mas conseguir retornar pros problemas que tentei levantar naquela texto tem me deixado mais tranquilo com seus defeitos.

Inclusive tem também me feito entender que meu percurso não é tão volúvel” quanto sempre imaginei (volúvel talvez para uma institucionalidade em que meus problemas talvez não façam muito sentido), que tem um percurso bem firme, consistente que segue retornando.

E claro, acho que ter escrito um memorial no final do ano passado ajudou a ter uma clareza sobre esse processo como nunca tive. Não acho que consegui transmitir essa clareza pra banca na época, mas consegui me dar por convencido de que as minhas obsessões pontuais tem uma ordem.

July 27, 2022

A inescapabilidade do problema do trabalho no mundo atual

Não é que o trabalho dignifica ou é a essência do homem, mas para bem ou para mal, ele (em sua forma assalariada) ainda parece ser aquilo que nos situa nesse mundo que vivemos.

O que significa que a gente não precisa sobrevalorizá-lo (ele não é tudo, nós somos mais que isso), mas no mundo em que vivemos é por meio dele que a maior parte das coisas ganha sentido (mas também, importante dizer também, esse mundo também não precisa ser só isso).

July 19, 2022

A função institucional da peer-review na filosofia

peer-review na filosofia é apenas um mecanismo de suporte para a distribuição dos (parcos) recursos financeiros da área, repassem.

A ausência de modelos alternativos ao peer-review (que podem até existir por aí, mas que tem um impacto quase nulo nas práticas de contratação habituais do campo e por isso não são tão relevantes para a reprodução do campo) é um sinal de definhamento do campo como um todo.

Sim, a filosofia está morrendo, mas não por qualquer esgotamento teórico (e o que diabos é isso?), e sim pelo fato de que o horizonte de expectativas que movia a renovação ~do pensamento~ já não consegue mais ser reproduzido pelas dinâmicas de trabalho e emprego que o sustentam.

Realmente vejo só dois caminhos, um que seria a intensificação das restrições, da diminuição de variedade que se abriu nas últimas décadas globalmente (mas aí você acaba fazendo realmente um movimento de retração com relação aos horizontes que se abriram e reoxigenaram o campo).

Nesse caso, a diminuição de empregos tornaria mais competitivas as disputas até que esse campo (na sua iteração universitária’) volte a ser desinteressante para boa parte das pessoas (que ainda vão continuar sendo filosóficas’, mas em outros meios) como era antes.

Isso até acho que vai acontecer, essa retração” nas universidades. A questão é que muitas expectativas foram construídas nesse período de mais empregos e não acredito que elas vão recuar. A impressão é que outros espaços, que passem a fazer mais sentido, vão se elaborar.

O que não significa que vai ser fácil né, só que a filosofia provavelmente vai começar a parecer uma coisa mais diferente do que ela é atualmente (bem, é parte do problema da hegemonia universitária ela calar variações do que pode ser o filosófico).

Eu fico com a impressão que isso é um momento interessante, uma espécie de aventura mesmo pelo tanto de experimentação que vai ocorrer (ou já está ocorrendo, mesmo que nem sempre visível) e que vai levar a uma outra direção (sem que nós vejamos qual).

Estudar a história da institucionalidade filosófica, as diversas maneiras que a filosofia foi praticada e organizada em sua história (ainda que eu faça isso muito superficialmente, bem longe de qualquer sistematização ou erudição) tem sido algo que tem me ajudado nesse momento.

Não só ajuda a ver que as formas de organização da filosofia são muito mais plurais do que as que dominam hoje em dia, como também deixam a gente ver que tem muito espaço para inventividade sem que sejamos determinados pelo que a filosofia já foi.

July 13, 2022

O campo da lógica dos saberes

Gostaria que tivesse um campo que investigasse as lógicas dos saberes (e não de conhecimentos, como a epistemologia). Que tentasse entender como a partir de determinadas restrições ou procedimentos, implicassem em certos saberes em vez de outros.

Como um platonista, sei que está meio fora de moda a ideia de saber’ (próximo demais a uma ideia de verdade num sentido mais existencial, talvez?), mas ainda assim acho que é um problema interessante pois mesmo que subdeterminado, me parece algo diferente de conhecimento’.

Assim, acho que daria pra perguntar não apensa pelos conhecimentos que se pode obter em determinado campo (a antropologia, a história, a psicanálise, por exemplo) a partir de certas condições, mas também por quais tipos de saberes se pode extrair de diferentes condições.

July 13, 2022

A dificuldade de levar projetos de pesquisa adiante

Nada como a alegria de começar a conectar os pontos de um novo projeto, começar a dar os primeiros passos sem saber ainda exatamente a forma que ele vai tomar. Fica ainda melhor quando vem junto com a certeza de que ele não deixa de ser uma reiteração de problemas antigos.

Eu diria a essa altura que meu problema maior (ao menos nesse momento) é menos abrir novas vias, novas questões e mais conseguir atar algumas coisas persistentes mais antigas que parecem reaparecer e se repetir de modo que não tem mais como deixá-las no plano das coincidências.

Claro, pra mim isso é complicado pois costuma me faltar justamente o ímpeto de retorno” para casa depois de sair de férias junto com as referências. É como se no momento que buscasse fazer uma síntese surgisse uma resistência imensa à concentração para elaborar um retorno.

July 7, 2022

Literatura contemporânea e antropologia

A presença de antropólogos no campo da literatura (pensando no Itamar Vieira Jr., mas também na Aparecida Vilaça e no Pedro Cesarino), mesmo que em formas híbridas, me parece mais um sinal do pólo atrator que as letras literárias” tem sobre o pensamento social brasileiro.

Tenho pensado muito nisso pois eu acho que existe uma ideia muito consolidada que em um país tão fraturado e socialmente disforme como o Brasil (com fraturas internas e externas), o ~literário (seja via o narrativo ou o ensaístico) acaba sendo uma forma de navegar nesse espaço.

É sintomático, portanto, que após duas décadas em que o pensamento antropológico mais contemporâneo tem dominado a cena nacional (ou tem ao menos aparecido com cada vez mais força como um campo inescapável), ele também acabe sendo literaturizado”.

Eu tenho a impressão que isso diz muito sobre o funcionamento da esfera pública nacional, sobre como se imagina no país a política (sobretudo entre as elites intelectuais, que não precisam ser elites econômicas) e também como se imagina que se lida com essas fraturas.

Eu não sei se consigo achar isso algo bom. Quer dizer, boa literatura, bom cinema, tudo isso é muito bom. Mas eu confesso que eu tenho ficado cada vez mais suspeito da crença de que há uma passagem simples da arte para o político tal como parece.

Eu também tenho ficado cada vez mais desconfiado da capacidade de 1) a arte conseguir mapear cognitivamente essa fratura, 2) ser a representação realmente um dos efeitos mais potentes da arte e 3) seus achados serem mobilizáveis politicamente por grupos (seja quais forem).

Isso não é uma crítica às obras em si, mas a leitura de Sérgio Ferro tem me feito pensar que arte tem mais a ver com fazer do que com propriamente representação. Inclusive a sua história parece ser uma espécie de libertação da função representativa (uma ideia trivial).

Eu acho que tem uma aposta meio problemática aí, já que mesmo quando boas obras sejam produzidas, me parece que elas são boas à despeito de qualquer eficácia política. O que não significa que o artístico não tenha lugar, mas talvez ele não precise ser diretamente político.

O que eu tenho pensado (e acho que é um dos esforços que estou engajado junto ao subconjunto de práticas teóricas”) é que o caminho talvez esteja já no interior do campo político, das experimentações (e suas posteriores expressões, balanços, saldos) que ocorrem ali.

É claro que nesse aspecto essa expressividade” pode de alguma forma tomar emprestado coisas do campo artístico (desde inspirações, procedimentos, fórmulas, etc), mas acho que quando funciona à coisa é feita ainda mantendo uma homogenidade” com o político, com o experimento.

É por isso que eu ainda mantenho apreço por algumas formas expressivas” que parecem de fato tomar bastante emprestado” das artes: desde as ficções etnográficas, às análises de conjuntura dramatizadas até os casos clínicos da psicanálise romanceados. A coisa pra mim vai por aí.

Essa thread é um fruto de conversas com @rftflppps e @TiagoGuidi1. Cenas do próximo capítulo EM BREVE [não tão breve].

Justiça seja feita, estou bastante impactado também pela leitura do manifesto” fundador da Revista Clima (de 1941) e também pensando — em geral — na maneira como essas figuras acabam representando um certo modelo do intelectual literário que me parece vingar um pouco no Brasil


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