May 15, 2021

Uma apresentação da pesquisa sobre a institucionalidade da filosofia

A verdade é que toda a minha pesquisa” oficial (mesmo que não pareça) é uma tentativa de inteligibilizar porque e como quando leio coisas de filosofia aquilo afeta. Afinal, que diabos o sujeito transcendental teria a me dizer com todos seus infindáveis jargões? E ainda assim…

Cada vez mais, em parte por conta de Platão, em parte por conta de conversas, tenho pensado que os termos são o que menos importam: quer dizer, eles importam como gatilhos para processos em que re-organizamos as formas como nós naveganos entre as inúmeras gramáticas disponíveis.

Mas acho que é difícil. Ainda tem ali uma distância (que sequer consigo nomear direito), mas que parece importante. Pois se consigo entender isso (que conceitos são apenas indicadores), ainda me parece esquisito entender o que eles apontam” e como isso nos transforma”.

Mas assim, e talvez seja importante, essa dificuldade de nomear o ponto inicial da filosofia (algo percebido de modo bem claro pelo Deleuze, sobretudo) é justamente seu solo constitutivo e seu espaço de intervenção. Por um lado ela diz algo sobre o sujeito, sobre situar-se.

Se a gente entende a filosofia como uma espécie de operação que procura pensar a boa vida (que outra vida que posso viver que não seja apenas essa, mas que seja melhor), isso pode ser compreendido como uma espécie de tentativa de se orientar por algo fora de nós.

O problema é que esse algo fora de nós é fora de nós. Ao mesmo tempo é a vida que não temos, que não somos. Por outro lado, e é isso que é esquisito, é a vida que queremos (e sendo da ordem do desejo, não faz parte de quem somos? Deleuze, Platão, Espinosa sorriem).

O que a filosofia mostra em sua atividade (e talvez seja difícil de engolir) é que somos nós mesmos na medida em que não nos conformamos completamente a uma certa autenticidade. Ou melhor, nossa autenticidade está em outra forma de nós mesmos. Daí o ascetismo perigoso rondando.

O que é a filosofia? Eu acho que em alguma medida o discurso filosófico (oral e escrito tem papéis e funções assimétricas — outro papo) é um gatilho que nos força a sair de nós mesmos. Mas não é ele quem produz os elementos estranhos, diria que ele apenas apontaria para eles.

O que tem de interessante na filosofia, e acho que o Maniglier capta muito bem nesse vídeo (https://youtu.be/nI7fNjBmoL0 ), é que ela acontece não quando algo não funciona”, mas quando funciona”, quando apesar dos nossos discursos, a realidade se encaixa de forma surpreendente.

Nesse sentido, diria que há forças que apontam para o estranhamento o tempo inteiro. Que as artes e as ciências, a política e o amor (pra pegar as quatro condições do Badiou) estariam o tempo inteiro produzindo as condições para mostrar como nós excedemos o que somos.

A filosofia acho que funciona como uma tentativa de mapear esses excessos, de costurá-los, de construir uma possibilidade de navegar entre eles (não para reduzi-los, embora isso seja sempre um risco inevitável), mas para nos mostrar que já estamos sendo excedidos a todo tempo.

O que significa que em certo sentido a filosofia não tem muito valor. Não é ela que nos tira de nós mesmos. Não é ela que explora essa distância entre o que somos e o que podemos ser. Podemos passar muito bem a vida sem ela. E ainda assim…

Eu acho que se ela aparece é por conta da inconsistência interna desses excessos. Eles não se fecham, não se harmonizam num total, de modo que se a filosofia tem um papel é simplesmente para nos lembrar que o processos de navegação entre quem somos e o que podemos ser não é reto.


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