November 3, 2018

Sobre a imagem do fracassado

Eu gosto muito da imagem do fracasso”, apesar das imagens ressentidas ou ligadas a uma falta que parecem rodar junto com essa ideia. Tem também sempre o risco dessa apologia ao fracasso se tornar apenas uma glorificação às avessas (“eles é que não me entendem/aceitam”).

Eu tenho tentado sentir o fracasso sempre contra isso. Contra essa imputação excessiva de demandas (completamente irreal e que no fim talvez seja uma forma de me reconfortar, visto que seria impossível’ dar conta das demandas) mas também contra essa ideia de glorificação.

Pensando aqui acho que o grande desafio é conseguir não cair nessas duas fases e entrar num estágio do fracasso em que você consegue assumir os problemas para com eles matar de pouco em pouco as suas pretensões e evitar dar espaço para a autoimagem se inflar além do indicado.

Tem uma certa plenitude zen ou do tao que existe no fracasso mas que dá trabalho alcançar e parece ter que ser conquistada toda vez do zero. Tal como um alcóolatra (lembro do Bateson) que nunca deixa de ser alcóolatra (e é esse o primeiro passo).

Somos (sou) antes de qualquer coisa esse movimento do ego que vai se inflando se nada impedir isso e não adianta mentir para si mesmo de que não (eis aí o primeiro deslize de volta pra bebida).

November 1, 2018

Espantalhos sobre a esfera cultural

Esse espantalho sobre a esfera cultural de que 1) o campo discursivo é dominado por pautas de progressistas/esquerda e que 2) posições conservadoras não encontram eco é difícil combater pois há uma recusa completa desses atores a entrar no jogo do debate.

O que vemos é uma posição que lembra a estratégia da moral escrava que Nietzsche elabora na Genealogia da Moral: que invalida de antemão a possibilidade de disputa devido à sua incapacidade de enfrentar diretamente seus adversários e é por isso que não precisa demonstrar nada.

Uma das consequências parece ser o que enfrentamos diariamente. Alguém pronuncia uma estupidez ou se posiciona de modo imbecil e diante do confronto só resta denunciar completamente a injustiça” desse ato de você se engajar no argumento dos outros, como se fosse uma violência.

Esse drible é certeiro (não surpreende Nietzsche hesitar e quase tecer elogios à moral escrava) já que muda completamente as regras do jogo (pois o fraco nunca esteve preso a esse jogo) e torna irrelevante qualquer desconstrução ou denúncia de contradições.

Eu não tenho ideia de como isso pega, mas algo me diz que tem a ver com o fato de que a maioria tende a ser passiva no campo discursivo (na internet é assim, com as proporções de pareto entre produtores e consumidores).

Ao se questionar o jogo que deixa a maior parte das pessoas na arquibancada (“elitista!”), esse contradiscurso parece conseguir sensibilizar os que (por inúmeros motivos) se mantinham à distancia mas nem por isso ignoravam o que se passava em campo.

Sem esse perigo de ser derrotado em campo, sem o perigo de ser destruído (já que o próprio jogo foi denunciado, a ideia de vencer por imposição é deslegitimado) qualquer um pode falar sem correr nenhum risco de ser desmascarado. Efetivamente se acaba jogando sem descer pro play.


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