January 6, 2021

O problema da referência na construção de uma gramática comum

Tenho pensado nesses dias sobre a quantidade de referências e enquadramentos disponíveis e a impossibilidade de dar conta de todos os campos. Se isso é a situação, então me parece absurdo exigir que as pessoas leiam x ou y para poderem conversar (supondo uma boa fé nas pessoas).

Quando falo de boa fé, quero deixar claro que não falo de situações em que o que é objeto de debate é justamente o enquadramento x ou y ou quando se quer falar de algo sem sem nem conhecer nada relacionado ao trma. Tou falando em conversas em que os quadros são auxiliares.

Ou seja, falo das situações em que mobilizamos ideias e/ou conceitos e/ou valores para conseguir se aproximar de um objeto qualquer e conseguir falar sobre ele com alguém que possivelmente (provavelmente) não domina e não apela para as referências que constroem nosso pensamento.

Nessas circunstâncias, qualquer demanda de conhecimento de mais um vocabulário, de mais um conjunto de jargões parece ser extremamente improdutivo. Parece apenas ser uma forma de botar pra escanteio qualquer conversa a partir da necessidade de uma referência contingente.

Claro que há situações que é preciso conhecer uma ou outra referência, mas dado como as coisas se organizam, como há uma certa finitude e como se observa facilmente pessoas fazendo coisas boas e convergentes com referências supostamente inconciliáveis, me parece pedir demais.

O tempo gasto deveria ser antes na construção de uma linguagem comum do que num suposto elencamento de trabalhos hercúleos que devem ser percorridos até um interlocutor está no níve do outro. Na verdade isso me parece insano, ainda mais que na maior parte das vezes é unilateral.

E comum não falo de qualquer estrutura genérica, qualquer imagem boba de uma racionalidade supostamente total. Falo de um comum entre quem está envolvido, num esforço que costuma ser dialógico (com quem está envolvido na conversa ou com o público a que se dirige a comunicação).

Enfim, claro que é massa conhecer coisas novas sempre, refinar e ampliar as referências. Mas me parece que se a ampliação das referências é feito à força (isto é, sem demandas concretas do problema ou sem que seja a única forma de conversar com seu interlocutor) isso é ruim.

Acho que na verdade até denota um sinal de que se está preso demais ao quadro referencial em questão. Talvez seja um argumento tosco (e é), mas confesso que duvido que tenham certos temas que possam ser trabalhados apenas a partir do filósofo x ou y.

Não ser capaz de dar um passo para trás denota que então se está mais preso ao autor do que propriamente aos problemas. E pode até ser que isso seja sua onda, mas se a conversa só se pode se dar nesses termos então acho difícil que haja conversa.

Inclusive sinto que é nessas conversas em que ambas as partes procuram sair de seus quadros habituais para tentar se entender que ocorrem estímulos para se envolver com outros quadros referenciais que podem ajudar a ampliar sua capacidade de se situar diante de problemas.


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