May 26, 2021

Educação a partir de Arendt

Acho o ensaio da Hannah Arendt sobre educação esquisito. Acho que tem coisas ali no diagnóstico que não consigo concordar completamente. Mas uma coisa que acho que vale ali é marcar a tarefa do educador como alguém que se abstém de ser ele próprio o local da mudança do mundo.

Isso tem a ver com a maneira como ela diz que o problema da educação é sobre como acolher” o novo num mundo velho. O texto é bem tortuoso (e simples ao mesmo tempo, o que lhe dá sua sofisticação mesmo com leituras esquisitas da realidade), mas isso depende de apresentar o mundo.

A crítica dela é que os educadores, em sua recusa ao mundo velho (justa), acabam também querendo adiantar” o trabalho de crítica a um ponto em que sequer se descreve o mundo velho por temer se associar a ele.

Não consigo ainda sistematizar direito como, mas acho que tem ali uma defesa importante (ainda que esquisita e as vezes fundamentada em diagnósticos meio fora) da preservação do novo” como um espaço que não se pode ocupar ou delimitar previamente com risco de desvirtuá-lo.

Eu penso nisso pois um dos afãs que vejo no campo teórico é de ocupar” o espaço da novidade. Vejo isso em algumas formas de se aproximar do pensamento ameríndio (que do jeito que funcionam acabam parecendo verdadeiras apropriações). Mas não é só aí que vejo problemas.

Acho que no desejo de não se identificar com o mundo que vivemos (justo), corre-se rápido demais para associar qualquer pessoa que se envolve com ele (ou que procura entendê-lo em seus termos) como um perpetuador desse mundo. Claro que tem desse tipo, mas não são todos.

E nesse sentido que acho que fica algo faltando dos dois lados. Por um lado evita-se entender o mundo em que somos inseridos (que não contém todos os problemas, mas que pela sua força acabam sendo determinantes demais de como as coisas funcionam).

Pra fugir disso acaba-se adotando rápido demais o partido da novidade”, como se ocupar seu ponto de vista fosse algo possível (como se bastasse entender suas teses e como se o deslocamento não precisasse ser ativamente construído por mediações). Acho que aí o novo se desfaz.

Acho que ainda tem um outro efeito pior que é achar que a novidade” aparece de forma substantivada. Que o que compõem uma perspectiva nova” é algo imaculado no mundo. Acho que isso é uma besteira imensa. A dificuldade do novo, de lidar com ele, ao meu ver, é sua distribuição.

O que há de novidade varia entre as perspectivas. Algumas vão ser ligadas ao mundo velho por certos pontos enquanto em outros locais são absolutamente novíssimos. Por outro lado, mesmo em coisas muito velhas pode-se encontrar pontos interessantes que apontam outros caminhos.

Eu diria então que uma perspectiva é constituída sempre de combinações desiguais de continuidades e descontinuidades e que o afã de estar do lado certo da história (o lado do ineditismo) acaba gerando espantalhos de ambos os lados que realmente só entravam as conversas.


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