Sobre a linguagem imagética de Carson
Eu tou lendo um ensaio da Carson (http://artandcrap.com/ensayos/anne-carson-variations-on-the-right-to-remain-silent/…) e acho que talvez seja possível ler a obra dela a partir do paradigma que ela elabora na leitura do Fedro no Eros, the bittersweet. Esse esforço de crescer asas na alma para vislumbrar [o real].
Eu sempre senti que ela pensa muito por imagens. Ela tem uma coisa com imagens que eu tenho dificuldade em conseguir exprimir. Nos textos teóricos é como se ela conseguisse produzir as sensações dos pensamentos simultaneamente às elaborações conceituais.
Mas nos textos não teóricos ela ainda parece estar preocupada com o que ela pensa mas abdicando um pouco mais da intermediação do sentido em nome da produção do pensamento por meio dos afetos e percepções geradas por uma imagem. O que é isso? Acho que é a ‘língua dos deuses’.
Ela consegue mobilizar imagens que produzem uma espécie de ascendência, a realidade vai ganhando mais sentido (se aproxima da “darkling vision”, pra usar a tradução da Rosemary Desjardins), mas a custo de produzir no próprio processo de ascenção uma espécie de bifurcação.
É como se você não conseguisse conciliar simultaneamente as duas perspectivas. O artifício que geram os afetos e as sensações de um pensamento (de um conhecimento [do real]) e, na outra perspectiva, os próprios afetos e sensações gerados, a experiência desses afetos e sensações.
Aí que entraria essa linguagem dos deuses, que, como ela diz no Eros, “nos diz mais sobre a verdade [do objeto], pois nos diz não apenas como o [objeto] deve ser nomeado, como também porque.” Mas enquanto seres finitos, essa linguagem só aparece pra nós de modo visível mas opaco.
Pelo menos a sensação que eu sinto quando eu leio os textos dela é um pouco essa. Eu sinto que algo tá acontecendo. Vejo que ela tá construindo imagens, mas há uma espécie de distância (seria o caráter ‘dos deuses’ da linguagem) que me impede de compreender mas não de sentir.