December 27, 2022

Uma reflexão a partir do final do livro I da República

Desde que reli para aula o final do livro I da República, não consigo deixar de pensar que existe alguma relação entre o romanesco e a organização da vida comandada pela alma (que é ela mesma uma parte dessa vida, um elemento interno a ela, aquilo de dentro que oderna).

A filosofia, o diálogo da alma consigo mesma, é aquilo que se utiliza de partes e pedaços da vida para compor uma ordem (uma boa ordem) e que nesse processo seja capaz também de transmitir algo (transmitir tanto uma verdade como também a necessidade de se participar disso).

December 25, 2022

Um Sérgio Ferrismo literário

Ando pensando esses dias como (pra mim) o Sérgio Ferro apresenta um modelo de análise de produções artísticas que poderia ser melhor sistematizado e que abre mão da ideia de representação/mimesis sem por isso deixar de ter algo que é mapeado/visivibilizado a partir de obras.

Um pouco como uma via que se pergunta (e elanora) que tipo de mapeamento cognitivo se torna disponível quando abrimos mão de uma aposta de que obras de arte naturalmente (como uma caixa preta) funcionam como um mapa natural da realidade social em sua forma ou conteúdo terminado.

December 9, 2022

A dificuldade da obra difícil

Uma coisa que sempre me fascinou foi a obra difícil”. Nada me convence que certos livros eram também ilegíveis (ainda que por razões diferentes) em seu tempo. O que faz alguém, no calor do momento, atravessar essa dificuldade, encarar a coisa, evitar reduzir ao conhecido?

Claro que nenhuma obra é uma ilha e o que existe é sempre em alguma medida uma comunidade de pessoas que já parecem sempre estar abertas pra também captarem o que está ali. Ainda assim me fascina que algumas pessoas precisem ser os marinheiros de primeira viagem.

November 26, 2022

Esboço de uma leitura karataniana do campo da ética

Uma das ideias que acho que não vou conseguir levar adiante mas fica como nota promissória, é a transposição das três lógicas de intercâmbio que o Karatani elabora no Estrutura da História Mundial para um plano ético.

O objetivo seria deslocar discussões éticas de qual o melhor sistema ético” para, vamos entender em que medida cada tipo de lógica ética acaba descrevendo diferentes aspectos dos fenômenos éticos sem que haja um esgotamento (também seria uma forma de homogenizar” o debate).

A princípio tenho na mente algumas ideias: Modo A (dádiva) —> Ética das virtudes Modo B (contrato) —> Ética deontológica Modo C (valor) —> Ética utilitarista

Assim, um fenômeno ético seria compreensível a partir dessas três lógocas ordenadas de determinada maneira. Ou seja, muito trabalho derivar isso (e ver as mudanças necessárias ao longo do caminho).

Por fim, acho que a ideia de perfeccionismo moral” do Cavell (que tou aos poucos tentando entender) talvez ajudasse a pensar a passagem de uma ética pra outra (mas aí, mais uma vez: trabalho pela frente).

November 22, 2022

O salto mortal da aula

Engraçado como é dar aula. Teve alguns detalhes cruciais sobre a discussão que ia tratar hoje (vida injusta x vida justa no final do livro I da República) que só fui perceber ao seguir o que eu tinha planejado (sem que estivesse previsto). É como se o texto se encaixasse ao vivo.

Esse tipo de acontecimento é das coisas mais incríveis de dar aula. Uma espécie de frio na barriga, pois mostra um limite bem concreto do quanto se dá pra preparar. O temor de que tem algo faltando” as vezes necessita de você ir na aula e encarar ela sem nóia.

É louco (na verdade não é, é apenas a verdade platônica em ato) como é a própria ignorância a condição de construção de um saber que excede sua própria finitude e aquilo que você (achava que) sabia.

November 15, 2022

Sobre falas carregadas

Uma forma de avaliar ideias (minhas, nossas) para mim é ver o que acontece quando elas aparecem na boca de gente que não está comprometida (mas sem que falte com seriedade) com o mesmo percurso e a mesma densidade com que abordamos certos problemas. Elas capotam ou se sustentam?

Pensando isso enquanto leio o Cavell, pois evidentemente a quantidade de discussões que ele carrega e traz para jogo que eu não sou familiarizado não é pouca coisa. Mas fico pensando, se conseguir dar consequência àquilo sem perdas (ou com o mínimo possível) não é sinal de força.

Falei força, mas quis dizer verdade. Na medida em que somos capazes de dar consequência a uma ideia (extrair implicações, aumentar o espaço do dizível, da nuance, do sentido), mesmo que não estejamos cientes de seus antecedentes, talvez haja algo de verdadeiro no que articulamos.

Por outro lado, me pergunto sobre o inverso disso. Quando você precisa sempre carregar” o dito de condições, de detalhes, de contextualizações… Não sou contra esses gestos, mas me parece que esse tipo de precisão é muitas vezes uma desculpa para travar consequências.

Não dá para estudar Platão sem conhecer grego, não é possível entender o que é um diálogo sem se situar nas discussões retóricas da época, não se pode avaliar os progressos conceituais sem uma comparação com reflexões pré-socráticas anteriores, etc.”

Parece um espírito censor.

Precisão, detalhes, é muito importante, acho, para situar aquilo que pensamos. Eu mesmo acho que tenho uma forma de encadear ideias que é infinitamente digressiva. Mas ainda assim, acho que quando as nossas digressões constrangem a quem nos dirigimos, sinto que há um problema.


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