March 23, 2021

O problema de pensar a partir do Brasil (via Paulo Arantes)

Sugestão para os amigos desavisados que querem ler o novo” do Paulo Arantes. Pulem o primeiro ensaio e leiam o segundo: Ideologia Francesa, opinião brasileira: um esquema”. Deixa mais claro os porquês de se aventurar por esse tipo de análise e que num é questão de briguinha”.

Inclusive acho cômico e triste como a própria forma como elaboramos uma resistência às metrópoles ainda tem a forma importada delas. Claro, acho que nada disso é voluntário, mas parece que essa insistência de alguma forma da limites pra qualquer voluntarismo que quer escapar.

Isso ficou meio truncado pelos caracteres. Dá pra traduzir isso de modo vulgar hein: que situação triste em que resistir às formas coloniais é fazer artigos expositivos ou exegéticos (jamais lidos) com conteúdo anti/decolonial. Claro, que isso não é tudo, mas é parte relevante.

A coisa só dá mais um giro melancólico/farsesco quando substitui as referências aos estrangeiros de fora pelos estrangeiros de dentro”. Acho que isso é um capítulo mais delicado pois as fronteiras da academia estão sendo efetivamente permeadas por quem não tinha espaço antes.

Por um lado de fato (e tentei defender isso no texto que escrevi pro Experimentos de filosofia pós-colonial”) temos a entrada de novas referências e novas formas de pôr as próprias questões que não combinam imediatamente com a maneira europeia e geram bons conflitos.

Por outro lado, isso não deixa de produzir um refugo perigoso por parte de quem estava dentro. Que se aproveita da mudança pra rapidamente objetificar e idealizar essas novas práticas convertendo elas em objetos de estudo” de maneira que enfraquece a potência crítica.

Uma espécie de conversão da nova matéria em doutrina” que apenas tem como efeito deslocar os termos da disputa de um campo entre acadêmicos em situação confortável e que acaba não pondo em questão as formas da disputa (daí termos apenas mais exegese).

Não acho que isso seja a maioria, mas a posição privilegiada de quem realiza essa manobra deveria deixar a gente mais suspeito, pois é quem efetivamente tem tração e espaço pra difundir suas práticas.

Por isso que não acho que essa novidade deva ser defendida apenas no plano das ideias. Acho que a forma de manter essas transformações vivas é lutar para que a universidade continue seu movimento de abertura (o que passa por repensar acesso e subida na hierarquia acadêmica).

Repensar avaliações de bolsas, acesso à pós e até a maneira como vão ser pensados e distribuídos os pontos temáticos em concurso. É nessa esfera, acredito, que é possível defender essas ideias novas.

Se o foco for apenas numa defesa vaga e não-prática de abrir para novas referências” acho que só acabamos reproduzindo o mesmo modelo que já domina a gente e que de fato bloqueia (ao enfraquecer o elemento conflituoso dessas novas ideias) transformações da cultura acadêmica.


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