Comentários sobre o padre de Fleabag
O Padre na segunda temporada de Fleabag enquanto amado é o gatilho sensível para uma série de práticas de cuidado de si que geram uma conversão da protagonista. Se é possível falar em amor platônico nessa série é nesse sentido.
O mundo vai se transformando a partir do momento em que a protagonista começa a se envolver no mundo do padre. Como alguém que está em outro local, outra vida, ela passa a ter o seu campo de atenção expandido. A ascenção do amor não é para um real transcendente, mas imanente.
Como o padre é sua paixão, e ela é atraída pra ele, a aproximação dele, a sensibilização do padre é também a percepção progressiva dos elementos que o compõem (sua moral, sua religiosidade esquisita). Ao prestar atenção nele outras coisas vão ganhando textura.
É nesse sentido que é possível dizer que o amor nos leva para o real. Ele nos leva pois a partir de uma diferença que faz diferença (e que o gozo dessa sensibilidade passa por atravessar essa diferença) somos jogados para outras diferençase depois outras e assim progressivamente.
Torna-se parte ativa do mundo não enquanto pessoa que domina as coisas, mas como alguém que passa a prestar atenção e ganhar esse hábito de modo consistente (mas que nem sempre é definitivo, que precisamos sempre reconstruir dado as tendências homogenizantes/anestesiantes).
É por isso que no final a personagem passa a amar a si mesma. Mesmo que a relação tenha dado ruim, isso importa (pois, afinal, um tipo de diferença sensível foi negado e bloqueado) mas também não importa (pois transcende-se a si própria em direção ás infinitas diferenças reais).
O mundo se torna inteligível não no sentido de dominado, de novo, mas de navegável pois agora, ao menos, prestamos mais atenção ao que nos cerca. Só assim é possível então dizer que se ama a si mesmo, pois percebemos que nós mesmos também somos infinitamente compostos.