Comentários sobre o discurso de Erixímaco em O Banquete
O discurso do Erixímaco é interessante pois ele projeta a divisão efetuada por Pausânias (que por sua vez conservava o caráter virtuoso como elemento essencial do ‘bom amor’) no interior do próprio corpo. O amor não é apenas algo que se dá entre humanos, mas entre qualquer ser.
O amor ganha mais aqui a sua feição de comunicação (não se encontra aí ainda essa ideia, mas vejo o germe), na medida em que ele é entendido como produzido à partir da harmonização de elementos discordantes. Mas é possível entender isso de duas formas, uma das quais vingou.
A forma que vingou é aquela que pensa o amor como uma união. Ainda que a ideia de fusão tenha longos ecos e seja bem forte, acho que, mesmo pra ficar no Erixímaco, isso seria contra o próprio fenômeno observado. A harmonia entre os discordantes não é uma fusão em um ser.
Se a questão é promovida por uma arte, é porque justamente há um esforço de construção e manutenção do caráter amoroso que não se sintetizou em uma unidade. Quem trabalha isso bem é o Badiou em seu “A cena do dois” (mas também, de forma mais compreensível em “Elogio do amor”).