June 9, 2023

Algumas ideias sobre como pensar o conceito de classe

Sobre a discussão do conceito de classe eu gosto desse texto da Lillian Cicerchia por ajudar a pontuar a relevância do conceito de classe atualmente: https://space.ideaofcommunism.com/uploads/e5766e0544647827020c7d41c681f15a.pdf… A discussão que fizemos no STP também foi particularmente produtiva e rica:

Particularmente acho que uma das coisas mais importantes dessa pegada que temos começado a construir no STP diz respeito à capacidade de mobilizar certos conceitos de muita tração na tradição comunista com uma precisão que torna a realidade social mais explicável.

A Cicerchia não faz parte do grupo, mas certamente a pegada dela ajuda pois de fato quando se fala de classe a ideia é não correlacionar de modo direto a ideia de uma classe proletária com trabalhadores industriais” de modo a essencializar suas características históricas.

O que parece estar em jogo mais é construir um conceito de classe de modo que seja possível compreender que num dado momento social certos grupos podem ser mais representativos na hora de iluminar certos problemas (sem no entanto exaurir completamente os problemas enfrentados).

Assim, quando a gente olha atualmente, me parece cada vez mais notável que certos grupos precarizados, como os entregadores, podem ajudar a explicar mais (e daí talvez um certo protagonismo político) alguns dos impasses atuais no mundo do trabalho.

Por outro lado, uma das vantagens do STP me parece ser também o fato de que o que entendemos como problemas relativos ao capital” (ao problema do valor) não exaurem a dominação social que predomina. Há também outras formas de troca igualmente relevantes: a dádiva e o contrato.

A dominação (e isso é um insight retirado do Karatani) se dá a partir de três sistemas de trocas, com uma configuração em que as trocas de mercadoria subordinam os outros dois tipos de troca sem que elas sejam irrelevantes (pelo contrário, recobrem pontos cegos as vezes).

Isso não é a troca mercantil, mas o efeito de uma série de acontecimentos históricos que constituiram esse espaço. Dessa forma, se a gente diz que a troca mercantil subordina as outras, isso tem a ver com no momento ela conseguir iluminar mais coisas (mas não tudo!).

Dessa forma, quando a gente consegue olhar para os problemas com esse olhar organizacional do STP alguns pseudo-problemas parecem se dissolver. Quem quiser conhecer mais, recomendo começar por aqui: https://crisiscritique.org/storage/app/media/nov-25/subset-of-theoretical-practice.pdf… e depois ir aqui: https://www.sum.si/journal-articles/atlas-of-experimental-politics

No atlas inclusive tem um esforço inicial de incorporar o problema da ecologia (na contribuição do @rmoscardip) no vocabulário (proj @JPCaron1) STP. Algumas coisas bem interessantes aparecem quando a natureza é considerada do ponto de vista organizacional e de seus intercâmbios.

May 29, 2023

Sobre a dificuldade de se perdoar

Um dos piores tipos de tristeza é aquela que diz respeito a algo que você já se perdôo. As racionalizações e ponderações já foram feitas, você já conseguiu dimensionar o peso de responsabilidade que tem e a impossibilidade de ser de outra forma. Mas aquela mágoa ainda continua.

É como de conseguir se situar, de se permitir aceitar que tem certas coisas que de fato não estão no seu alcance aqui e agora (mas que podem estar amanhã e depois), que algo ainda permanece. É como se estar resolvido te deixasse ainda mais disponível pra sentir aquela tristeza.

É uma coisa bem agridoce. Ao mesmo tempo que eu me sinto satisfeito, pleno, eu fico sentindo ali aquela decepção no fundo, como algo que resiste. Se fosse uma coisa que se anulasse seria ótimo, mas na minha cabeça fica como uma gangorra, em que a serenidade e a mágoa oscilam.

May 11, 2023

Os limites do ecossistema literário nacional

Pensando muito que a gente talvez tenha que apenas dizer não para o universo expandido Moreira Salles. Eu também amaria que ele (ou alguém do complexo famigliar) me escolhesse como bobo da corte, de modo que pudesse pagar minhas contas mais tranquilamente, mas que merda, né?

Nenhum dos empreendimentos desse complexo famigliar vai resolver os problemas que temos. A ciência não vai dar saltos (afinal, não é um instituto de financiamento que faz isso), a esfera pública não vai se tornar mais viva, o mundo editorial não será mais amplo que SP-RJ-POA.

Eu acho que a gente quer isso, a gente sofre com editais do serrapilheira, com concursos da serrote, pois de fato tudo o que a gente quer é uma oportunidade (sobretudo num momento em que as promessas [kkkkk] de uma vida em que todos são professores universitários se desfazem).

Eu acho que algumas pessoas vão conseguir se incluir nesse mundo (um salve para vocês!) mas para a maior parte de nós, acho que vão sobrar só as expectativas e frustrações a partir das migalhas que chegam. E no fim das contas nos fazem acreditar que é o único caminho.

Não ironicamente eu acredito cada vez mais que existe um esforço muito grande de organizar os sistemas de transmissão e circulação de ideias de maneira concêntrica. Como se o que houvesse fossem circulos cada vez mais afastados de um centro (um bilionário, i.e., Moreira Salles’).

Essa imagem é sufocante, ela nos faz acreditar que fora conseguir ir se incluindo nesses círculos mais centrais, que vamos ter fracassado de alguma forma, ou que de alguma forma não demos conta do recado (ou não olharam para a gente, não deram uma oportunidade).

Depois de acompanhar certos debates nessa rede (sobretudo no que diz respeito às reedições do Candido, à incapacidade da crítica literária de criticar dando nomes aos bois e assim por diante), fico cada vez mais convencido de que só uma indiferença pode nos ajudar.

Essa indiferença inclusive ajudaria a nós (os que, como eu, são de maneira bastante frustrantes, seduzidos pelo canto, pela promessa de uma ajuda de um bilionário) a perceber que já tem muita gente indiferente a isso, tocando uma série de processos massas.

April 27, 2023

Sobre a ingenuidade metafilosófica dos filósofos metropolitanos

Amo demais acompanhar de longe as reflexões metafilosóficas dos companheiros do mundo anglo. Parecem notícias chegadas de uma terra estrangeira muito distante, com costumes bastante diferentes e valores totalmente estranhos.

E sempre uma delícia acompanhar esse ar pseudo-humilde que busca ao mesmo tempo sistematizar a instituição filosófica global (e totalmente ignorante para o que acontece fora da academia anglo) enquanto discute tudo em termos de pitaco” que são apenas impressões.

Mas assim, quem sou eu pra falar qualquer coisa também! Já que o meu interesse pelo que acontece na academia aqui diminui a cada dia (não por certos trabalhos individuais, que acompanho, mas por um certo campo, um certo conjunto de hábitos, de formas de socialização e interação).

O que me salva é que felizmente não acredito que a filosofia que acontece nas universidades é mais que um pentelhésimo do que a atividade filosófica pode e é (como também a minha própria participação na atividade é também um pentelhésimo do campo total possível, graças a deus).

April 27, 2023

Os limites do historiografismo na filosofia

cada vez mais chegando à conclusão que historiografismo (contexto como critério para entendimento) é um substituto empobrecedor de uma aproximação subjetivada (implicada, engajada, compartilhada) de problemas que fazem pensar (sejam artísticos, políticos, científicos, etc).

ora ora se não é uma pessoa que foi absolutamente contaminada pela leitura de O Século, um leitura totalmente subjetivada do século XX.

Eu diria inclusive que em termos pedagógicos, o historiografismo (que é um excelente auxílio, mas que não pode se assumir como norma principal) mais atrapalha que ajuda ao soterrar o que pode haver de interessante no que analisamos (o que nos conecta com essa coisa).

April 25, 2023

A dificuldade de se pensar o currículo na filosofia

Acho que a maior dificuldade de se pensar um currículo de filosofia é conseguir lidar com a variedade imensa de tempos de interesse que aparecem na percurso (para o caso mais simples: nem tudo se mostra interessante quando temos contato inicialmente, e só anos depois nos atrai).

Não há mesmo garantia que o interesse possa ser sistematicamente suscitado (a figura do mestre tem um papel, mas não raro o interesse desaparece assim que alguém se afasta do mestre). Por outro lado, certos campos (todos?) exigem desenvolvimento de habilidades que requerem tempo.

Como lidar com 1) o fato de que a filosofia não costuma ser o espaço em que questões aparecem, mas, quando muito, o espaço que elas se consolidam (que motivam alguém a insistir) 2) e também com a impossibilidade de ter uma disponibilidade absoluta para receber todas as questões?

A ideia de que métodos, ferramentas formais, um conjunto de habilidades, técnicas de leitura etc (seja lá como queiram descrever certas práticas de lida com problemas filosóficos) possam ser suificientes também não me convencem pois costuma faltar dar conta do impulso motivador.


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